Quando o Mestre Não Aparece

Sobre Presença, Maturidade e o Tempo de Cada Um

Quando o Mestre não aparece é uma antiga parábola — atribuída ora a mestres sufis, ora a mestres zen — que sempre me atravessa quando penso sobre presença, disponibilidade e profundidade nas relações. Então, conta-se que um grande Mestre anunciava suas palestras muito aguardadas, e pessoas de vários povoados caminhavam durante dias para ouvi-lo. Contudo, era uma época sem transportes, sem facilidades, sem atalhos. Apenas o desejo sincero de chegar, aprender e transformar-se.

Mas quando todos finalmente se reuniam…
O Mestre não aparecia.

As pessoas se sentiam enganadas

Isso se repetiu, de maneiras diferentes, muitas vezes: ele ia, mas não falava o que o grupo esperava: se desculpava e ia embora. As pessoas murmuravam, reclamavam, sentiam-se enganadas.
E, pouco a pouco, a multidão foi diminuindo.
Primeiro os apressados.
Depois os curiosos.
Depois os que buscavam apenas entretenimento espiritual.

Até restarem apenas poucos — muito poucos — que continuavam ali, aguardando a tão esperada mensagem. Não por expectativa, não por idolatria, não por ansiedade.
Mas por presença.

Foi então que o Mestre chegou, observou os presentes, e disse:

“Agora posso falar.
Só quem realmente está pronto permaneceu.”

Essa frase é, para mim, um espelho do mundo contemporâneo.

Vivemos numa era de excessos: excesso de estímulos, conteúdo, pressa, urgência e promessas de mudanças instantâneas. O tempo inteiro somos convidados a “estar” em mil lugares, mas quase nunca “somos” em nenhum. Então, queremos respostas rápidas, soluções mágicas, transformações em cápsulas. E, quando o processo exige espera, profundidade ou desconforto, muitos vão embora antes mesmo de a aprendizagem começar.

Quando o Mestre não aparece.

O Mestre que não aparece nos lembra que:

  • A verdadeira transformação exige maturidade emocional.
  • Presença é mais rara (e mais valiosa) do que talento.
  • A profundidade só se revela a quem permanece.
  • A pressa expulsa a sabedoria.
  • E não há crescimento real sem atravessar o silêncio, a espera e a frustração.

Penso muito sobre isso em meu trabalho com pessoas, cultura, liderança, eneagrama e segurança psicológica. Vejo empresas desejando inovação imediata, equipes buscando resultados sem consistência, líderes querendo mudanças profundas sem atravessar o próprio incômodo. E vejo também — com alegria — aqueles que permanecem. Os que respiram antes de reagir. Os que observam antes de julgar. Aqueles que compreendem que processos humanos não se aceleram pela força, mas pela presença.

Talvez todos nós, em algum momento, tenhamos vivido o “não aparecimento” do Mestre:
O projeto que atrasou.
O desafio inesperado.
A resposta que não veio.
A pessoa que não correspondeu.
E a pausa que não planejamos.

E, se permanecemos, aprendemos algo sobre nós.

O que descobrimos quando decidimos ficar

Porque no final, a grande sabedoria dessa história não é sobre um Mestre misterioso que testava seus discípulos — mas sobre o que cada um de nós descobre quando decide ficar. Quando escolhe seguir, mesmo quando o caminho não atende às nossas expectativas.

O Mestre só aparece quando estamos prontos.
E esse “prontos” não tem a ver com conhecimento — tem a ver com estado interno.

Hoje, talvez mais do que nunca, precisamos reaprender a permanecer — em nós, nas relações, nos processos, nos propósitos. Precisamos desacelerar o passo para que a vida possa nos alcançar. E precisamos lembrar que a profundidade nunca esteve nas multidões, mas na disponibilidade silenciosa de quem realmente deseja se transformar.

O Mestre não aparece para multidões.
Aparece para presenças.

Que possamos estar no grupo dos que permanecem.

Sou sempre grata aos que me acompanham…

Sou sempre inspirada pelos que eu acompanho.

Boa semana.

Sarita Cesana

Psicóloga CRP 17-0979

@saritacesana_                  @implementeconsultoria

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