Presenteísmo e Absenteísmo

Os Problemas (não tão) Invisíveis no Ambiente de Trabalho

Neste artigo vamos falar sobre Presenteísmo e Absenteísmo, os problemas invisíveis no ambiente de trabalho. Você já chegou ao trabalho com uma dor de cabeça latejante, completamente exausto, mas sentiu que não podia faltar? Ou passou o dia inteiro na frente do computador, mas sua mente estava em outro lugar, incapaz de se concentrar? Se a resposta é sim, você já experimentou o presenteísmo – e não está sozinho.

Enquanto o absenteísmo – a ausência física do trabalho – é facilmente medido e amplamente discutido, existe um fenômeno silencioso e muito mais insidioso acontecendo nos escritórios, fábricas e ambientes corporativos: o presenteísmo. E sua relação com a saúde mental dos trabalhadores é um dos desafios mais urgentes (e negligenciados) da gestão de pessoas contemporânea.

Absenteísmo vs. Presenteísmo: Entendendo a Diferença

O absenteísmo é direto: o colaborador não comparece ao trabalho. Seja por doença, problemas pessoais ou outros motivos, a ausência é visível, mensurável e, geralmente, justificada.

O presenteísmo, por outro lado, é o elefante na sala. É quando a pessoa está fisicamente presente no ambiente de trabalho, mas mentalmente e emocionalmente ausente. Ela comparece, cumpre horário, está na reunião, mas sua capacidade de produzir, concentrar-se e engajar-se está severamente comprometida.

A diferença crucial? O absenteísmo é visível. O presenteísmo é invisível – e justamente por isso, muito mais perigoso.

O Presenteísmo Como Sintoma de Saúde Mental Fragilizada

O presenteísmo raramente é uma escolha consciente. Na maioria das vezes, é um sintoma de problemas mais profundos relacionados à saúde mental.

A pessoa está completamente esgotada – emocional, física e mentalmente. Mas mesmo assim, arrasta-se para o trabalho todos os dias. Há uma desconexão total entre o que o corpo pede (descanso) e o que a mente ordena (não posso parar). O resultado? Presença física sem energia, criatividade ou engajamento real: Burnout

A ansiedade cria um ciclo perverso. A pessoa tem medo de ser vista como fraca, não comprometida ou dispensável se tirar um dia de folga. Então vai trabalhar mesmo doente, mesmo exausta, mesmo sem condições. Ironicamente, sua produtividade fica tão comprometida que ela acaba gerando exatamente o resultado que temia: trabalho de qualidade inferior.

Na depressão, tarefas simples parecem montanhas intransponíveis. A pessoa vai ao trabalho porque “é o que se deve fazer”, mas está funcionando no modo de sobrevivência. Não há energia para contribuições significativas, para pensar criativamente, para se conectar com colegas. É estar ali sem realmente estar: presenteísmo.

Quando o estresse se torna crônico, a pessoa entra em modo automático. Ela está presente, mas sua capacidade cognitiva está reduzida. Comete mais erros, esquece compromissos, precisa reler o mesmo e-mail três vezes. Está operando a 30% da capacidade, mas ninguém percebe – até que algo crítico falha: piloto automático.

Presenteísmo e Absenteísmo

Por Que o Presenteísmo É Invisível (E Por Isso, Perigoso)

A Cultura do “Herói Corporativo”

Em muitas organizações, ainda existe a romantização do sacrifício pessoal. Aquele que chega primeiro, sai por último, nunca falta, trabalha doente. Essa pessoa é vista como “dedicada” e “comprometida”. Essa cultura tóxica recompensa o presenteísmo e pune quem ousa priorizar sua saúde.

Métricas Que Valorizam Presença, Não Resultado

Quando a avaliação de desempenho considera primariamente horas trabalhadas e presença física, o presenteísmo se torna inevitável. O colaborador aprende que “estar lá” importa mais do que “entregar resultados com qualidade”.

Falta de Segurança Psicológica

Em ambientes onde não há abertura para falar sobre saúde mental, onde admitir vulnerabilidade é visto como fraqueza, os colaboradores escondem suas dificuldades. Eles comparecem fisicamente, mas carregam sozinhos o peso de suas lutas internas.

O Problema da Invisibilidade

Diferente de uma perna quebrada ou uma gripe aparente, os problemas de saúde mental são invisíveis. Ninguém vê a ansiedade, a exaustão emocional, a depressão. Então a pessoa trabalha em silêncio, sofrendo em silêncio, deteriorando-se em silêncio.

As Consequências do Presenteísmo

Para o Indivíduo

O presenteísmo não é sustentável. A pessoa que continua trabalhando sem estar em condições adequadas está, na verdade, adicionando combustível a um incêndio. Os problemas de saúde mental se agravam, o esgotamento se aprofunda, e o que poderia ser resolvido com alguns dias de descanso se transforma em um afastamento prolongado – ou pior, em danos permanentes à saúde.

Para a Equipe

O presenteísmo não acontece em bolhas. Quando um membro da equipe está presente mas não funcional, os outros precisam compensar. Há também o contágio emocional: a energia baixa, a falta de engajamento, o pessimismo se espalham. A moral da equipe cai, o clima organizacional se deteriora.

Para a Empresa

Estudos mostram que entre presenteísmo e absenteísmo, o presenteísmo custa mais às organizações. Por quê? Porque:

  • A produtividade é drasticamente reduzida (estimativas variam entre 30-70% de queda)
  • A qualidade do trabalho cai, gerando erros e retrabalho
  • Aumenta o risco de acidentes, especialmente em ambientes operacionais
  • Cria um efeito cascata que contamina equipes inteiras
  • Eventualmente, leva a afastamentos prolongados muito mais custosos
  • Contribui para turnover e perda de talentos

É a “produtividade fantasma”: parece que está tudo funcionando, mas a entrega real é apenas uma fração do potencial.

Quebrando o Ciclo: Caminhos Para a Mudança

Liderança Humanizada e Atenta

Líderes precisam desenvolver sensibilidade para perceber sinais de presenteísmo em suas equipes. Queda de performance, mudanças de comportamento, isolamento social, aumento de erros – tudo isso pode indicar que alguém está presente apenas fisicamente. Mais importante: é preciso criar espaço seguro para conversas honestas sobre saúde mental e bem-estar.

Políticas Reais, Não Apenas Discurso

Não basta ter um programa de bem-estar no papel. É preciso:

  • Dias de saúde mental sem necessidade de justificativa médica
  • Flexibilidade real para que as pessoas ajustem suas rotinas conforme necessário
  • Acesso facilitado a apoio psicológico
  • Políticas de trabalho remoto ou híbrido que reconheçam diferentes necessidades
  • Avaliação de desempenho baseada em resultados, não em horas ou presença

Cultura Que Valoriza Saúde e Resultados

A mudança cultural é a mais difícil, mas a mais necessária. Significa:

  • Celebrar quem tem coragem de dizer “preciso de um dia de descanso”
  • Normalizar conversas sobre saúde mental
  • Treinar lideranças para identificar e responder adequadamente a sinais de sofrimento
  • Desromantizar o sacrifício pessoal e o “workaholic”
  • Reconhecer que cuidar de si não é fraqueza, é responsabilidade

Educação e Conscientização

Muitas pessoas não sabem identificar o presenteísmo em si mesmas. Programas de educação sobre saúde mental, sinais de alerta de burnout, importância do autocuidado e limites saudáveis são essenciais para que os próprios colaboradores aprendam a se proteger.

Conclusão: Presença não é o mesmo que Estar Presente

O presenteísmo é um sintoma de que algo está profundamente errado – seja na cultura organizacional, nas práticas de gestão, ou na saúde mental dos colaboradores. É hora de reconhecer que ter corpos ocupando cadeiras não é o mesmo que ter mentes engajadas e pessoas saudáveis.

Combater o presenteísmo não é apenas uma questão de produtividade ou redução de custos. É uma questão de humanidade. É reconhecer que as pessoas que fazem as organizações funcionarem são, antes de tudo, seres humanos que merecem trabalhar em condições que não destruam sua saúde mental.

Quando criamos ambientes onde é seguro ser vulnerável, onde é possível dizer “não estou bem” sem medo de consequências, onde resultados importam mais que performance teatral de dedicação, todos ganham. As pessoas são mais saudáveis, mais engajadas, mais produtivas. As equipes funcionam melhor. As organizações prosperam.

Talvez seja hora de perguntar: em sua organização, quantas pessoas estão realmente presentes? E quantas estão apenas… lá? Agora você entende a diferença de presenteísmo e absenteísmo?

Sarita Cesana

Psicóloga CRP 17-0979

Cientista da Felicidade

@saritacesana_                @implementeconsultoria

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