Nesta sexta feira o mundo da Psicologia perdeu um de seus mais renomados defensores: Bruno Soalheiro tira a própria vida. Mesmo nunca tendo encontrado com ele, sempre o ouvia, fiz alguns de seus cursos, ria e aprendia com seu jeito irreverente, criativo, debochado, inovador, crítico e inteligente de ser.
Fiquei muitooo chocada!!! Mesmo antes de saber o que realmente havia acontecido, senti essa perda. Então, muitos acharam que seria mais uma de suas estratégias de marketing, sempre provocativas e “chocantes”. Mas não era: era muito, muito, muito sério e verdadeiro. Bruno Soalheiro tira a própria vida, mesmo em um dos melhores momentos de sua existência, com lançamentos totalmente vendidos, uma casa dos sonhos terminando, um casamento feliz, sendo reconhecido, e candidato a Presidência do CFP (Conselho Federal de Psicologia), alguma coisa terrível e “invisível” estava acontecendo internamente.
Por tudo isso resolvi escrever acerca de:
A Dualidade entre Sucesso e Saúde Mental: Reflexões Necessárias
A notícia recente do falecimento de Bruno Soalheiro, psicólogo respeitado e autor de sucesso, nos convida a uma reflexão profunda sobre a relação entre sucesso profissional e saúde mental. Como sociedade, frequentemente associamos conquistas externas e reconhecimento público a um bem-estar interior completo, mas a realidade se revela muito mais complexa e, por vezes, contraditória.

A máscara do sucesso
O sucesso profissional, especialmente quando acompanhado de visibilidade pública, frequentemente cria uma expectativa de completude e felicidade. Aqueles que alcançam reconhecimento em suas áreas são muitas vezes vistos como pessoas que “chegaram lá” – indivíduos que supostamente resolveram os grandes desafios da existência humana. No entanto, essa percepção superficial ignora uma verdade fundamental: o ser humano é complexo, e nossas lutas interiores raramente se resolvem com conquistas externas.
Para profissionais da saúde mental, essa contradição pode ser ainda mais acentuada. Existe uma expectativa implícita de que psicólogos, terapeutas e outros especialistas no campo tenham “resolvido” suas próprias questões emocionais. Esta expectativa não apenas é irrealista, como também prejudicial, criando um peso adicional sobre esses profissionais.
As lutas invisíveis
O que muitos não compreendem é que por trás de sorrisos em palestras, livros publicados e seguidores nas redes sociais, podem existir batalhas silenciosas sendo travadas. A depressão, a ansiedade e outros transtornos mentais não discriminam por status social, conquistas acadêmicas ou reconhecimento profissional.
Pessoas de sucesso frequentemente enfrentam desafios particulares relacionados à sua posição:
- A pressão constante para manter um alto nível de desempenho;
- A sensação de que não podem demonstrar vulnerabilidade;
- O isolamento que pode surgir quando são colocadas em pedestais;
- A desconexão entre sua imagem pública e seus sentimentos privados;
- A dificuldade em buscar ajuda quando são vistas como “exemplos” a seguir.
Redefinindo sucesso e bem-estar
Talvez seja hora de revisitarmos nossa definição de sucesso. Uma carreira próspera, reconhecimento público e conquistas materiais são aspectos válidos da realização humana, mas não podem ser tomados como sinônimos de plenitude ou felicidade.
O verdadeiro sucesso talvez esteja mais relacionado à integração saudável entre diferentes aspectos da vida – trabalho, relacionamentos, autocuidado, propósito e significado. Esta visão mais holística nos permite honrar tanto as realizações profissionais quanto as necessidades emocionais e psicológicas que todos compartilhamos, independentemente de títulos ou status.
A importância do autocuidado para todos
Se há uma lição que podemos extrair destas reflexões, é que o autocuidado não é um luxo, mas uma necessidade fundamental – especialmente para aqueles que dedicam suas vidas a cuidar dos outros. Práticas como:
- Estabelecer limites claros entre vida profissional e pessoal;
- Cultivar relacionamentos autênticos onde se possa ser genuinamente vulnerável;
- Buscar ajuda profissional quando necessário, sem vergonha ou hesitação;
- Praticar autocompaixão e gentileza para consigo mesmo;
- Reconhecer sinais de esgotamento e respeitá-los.
São essenciais não apenas para sobreviver, mas para viver com significado e propósito.
Um convite à empatia e compreensão
A perda de figuras públicas para o suicídio, especialmente aquelas dedicadas ao campo da saúde mental, deve servir como um lembrete poderoso de que as aparências externas raramente contam a história completa. Em vez de idealizarmos ou julgarmos, somos convidados a desenvolver uma compreensão mais nuançada e compassiva da experiência humana.
Cada pessoa, independentemente de seu sucesso ou status social, carrega sua própria complexidade interior. Reconhecer essa verdade nos permite construir uma sociedade mais empática, onde o sucesso seja medido não apenas por conquistas, mas também pela capacidade de viver autenticamente, com todas as alegrias e desafios que isso implica.
Ao lamentarmos a perda de Bruno Soalheiro, e tantos outros que partiram prematuramente, podemos honrar suas memórias ao continuarmos as conversas importantes que iniciaram em vida. Podemos trabalhar juntos para criar espaços onde o sucesso e a vulnerabilidade possam coexistir, onde pedir ajuda seja visto como sinal de força, não de fraqueza.
A jornada humana é, por natureza, repleta de contradições. Talvez nossa tarefa não seja eliminá-las, mas aprender a navegá-las com graça, compaixão e suporte mútuo.
Que ele alcance a paz que buscou, mas que não encontrou nesta existência.
Como psicóloga, devo buscar, cada vez mais, falar sobre este tema difícil e assustador, porém que tem impactado a vida de tantas pessoas, gerando culpas, sofrimento e dor.
Sarita Cesana
Psicóloga CRP 17-0979
@saritacesana_ @implementeconsultoria