Os BRICS

Integração baseada no desenvolvimento sustentável

Os BRICS são uma aliança internacional de países emergentes fundada em 2009 por Brasil, Rússia, Índia e China. Seu nome provém da primeira letra dos países fundadores, sendo que a África do Sul se incorporou oficialmente em 2010. Em 2023, a aliança ampliou sua influência ao incorporar novos membros como Egito, Etiópia, Irã, Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos. A esses se somam países convidados como Bolívia, Indonésia, Nigéria, Cazaquistão, entre outros que participam como observadores ou aliados regionais. O objetivo dessa aliança é reformar a ordem econômica mundial com uma visão multipolar e centrada no Sul Global. Da mesma forma, também existem aspectos de integração baseada no desenvolvimento sustentável.

Os BRICS concentram mais de 40% da população mundial e controlam vastos territórios com importantes capacidades ambientais. O Brasil possui 12% da água doce superficial do planeta e mais da metade da floresta amazônica. A Rússia contém mais de 20% das florestas boreais do mundo e enormes reservas hídricas na Sibéria. A Índia possui uma grande biodiversidade, embora fragmentada pela urbanização e pelo uso agrícola intensivo. A China reflorestou milhões de hectares para conter o avanço do deserto de Gobi. A África do Sul, por sua vez, conta com uma riqueza biológica incomparável aos demais países dos BRICS. No entanto, enfrenta grave degradação de ecossistemas causada pela mineração e expansão urbana.

Os Recursos Energéticos

Quanto aos recursos energéticos, os BRICS possuem uma posição dominante em combustíveis fósseis e matérias-primas estratégicas. A Rússia é o segundo maior exportador mundial de gás natural e possui grandes reservas de petróleo. A China lidera a produção de carvão e concentra o refino de minerais críticos como lítio e cobalto. O Brasil é produtor de petróleo offshore e biocombustíveis, com uma matriz energética relativamente limpa. A Índia depende do carvão para mais de 70% de sua eletricidade. Por fim, a África do Sul baseia sua matriz no carvão e exporta minerais intensivos em energia como platina e ouro.

Ainda sem coordenação ambiental transnacional

Diante dessa realidade, surge a pergunta: os BRICS podem estabelecer normas comuns que regulem o impacto ambiental de suas operações extrativas? Até agora, não existe uma regulamentação ambiental conjunta nem compromissos coletivos vinculantes sobre a exploração de recursos. Cada país mantém suas políticas energéticas e de gestão de resíduos de forma soberana, sem coordenação ambiental transnacional. Tampouco existem tratados regionais entre eles que limitem emissões ou regulem danos ambientais compartilhados. A ausência de institucionalidade ambiental dentro do bloco limita sua capacidade de impor padrões comuns. No entanto, mencionou-se que a criação do Banco de Desenvolvimento dos BRICS poderia abrir possibilidades de condicionar o financiamento a metas verdes.

Mudar a matriz energética a partir do bloco BRICS enfrenta profundas dificuldades estruturais e econômicas. A China é a maior emissora global de dióxido de carbono e depende do carvão como base industrial. A Rússia obtém mais de 40% de seu orçamento nacional com as exportações de petróleo e gás. A Índia enfrenta uma crise de resíduos urbanos, com baixa cobertura de reciclagem e alta dependência da incineração. O Brasil sofre com taxas alarmantes de desmatamento, especialmente na Amazônia e no Cerrado. A África do Sul perdeu grande parte de sua biodiversidade pela falta de aplicação de leis ambientais. Portanto, a tão necessária transformação energética requer investimentos, vontade política e cooperação real entre os membros. Atualmente, os BRICS têm centrado seus esforços de cooperação primordialmente em aspectos econômicos, que contrastam com suas metas ambientais.

Os países não fundadores

Da mesma forma, os países não fundadores como a Bolívia e a Nigéria também enfrentam desafios ambientais ainda mais urgentes. A Bolívia sofre com incêndios florestais recorrentes na Chiquitânia e na Amazônia, agravados por leis permissivas e pouca fiscalização. A legislação ambiental boliviana é fracamente aplicada, com altas taxas de descumprimento nos setores extrativos. A Nigéria, com mais de 220 milhões de habitantes, enfrenta uma crise de desmatamento, poluição hídrica e resíduos sólidos. Sua elevada taxa de natalidade pressiona ecossistemas, infraestrutura e serviços básicos. Ambos os países compartilham com os BRICS um modelo extrativista pouco compatível com uma transição ecológica justa.

Os BRICS

Divergência institucional – um obstáculo a adoção de normas ambientais comuns

Nesse contexto, qual proposta distinta os BRICS podem oferecer à ordem climática global? Ao contrário do modelo europeu, os BRICS poderiam priorizar a justiça climática, a equidade e o financiamento adaptado ao desenvolvimento. O enfoque Sul-Sul permite propor soluções baseadas na cooperação técnica, investimento produtivo e transferência tecnológica. Também podem criar mecanismos regionais de compensação ambiental, como fundos de restauração ecológica ou títulos soberanos verdes. Portanto, devem evitar reproduzir lógicas extrativistas sob discursos verdes que carecem de efetividade real.

Um aspecto crítico é a compatibilidade jurídica entre os países dos BRICS, que apresentam grandes divergências institucionais. A China é uma república autoritária com sistema legal subordinado ao Partido Comunista. O Brasil, por outro lado, é uma democracia constitucional com separação de poderes e controle judicial ativo. A Rússia combina um presidencialismo forte com restrições à sociedade civil e à imprensa livre. A Índia mantém uma democracia vibrante, mas com crescentes restrições a defensores ambientais. A África do Sul possui um marco jurídico progressista, embora enfraquecido por corrupção e violência estrutural. Essas diferenças dificultam a adoção de normas ambientais comuns ou mecanismos de cumprimento compartilhado.

Uma oportunidade única do Brasil assumir o protagonismo na COP30

Apesar dos obstáculos, a liderança do Brasil como anfitrião da COP30 e presidente dos BRICS em 2025 oferece uma oportunidade estratégica. O Brasil pode impulsionar uma “agenda verde do Sul” articulando interesses climáticos com direitos sociais e econômicos. Para isso, deve liderar a elaboração de instrumentos jurídicos regionais compatíveis com o Acordo de Paris. Além disso, poderia propor a criação de um Observatório Ambiental dos BRICS que sistematize dados, boas práticas e alertas precoces. O uso coordenado de políticas fiscais verdes e regulamentação ambiental pode ser um primeiro passo rumo à convergência climática entre os países membros.

Como dado curioso, os BRICS controlam aproximadamente 60% da produção global de carvão e 45% das reservas de petróleo. No entanto, nenhum de seus membros está formalmente obrigado por metas climáticas comuns além de suas NDCs. China e Rússia evitaram compromissos em tratados multilaterais com sanções por descumprimento ambiental. Índia e África do Sul priorizam o desenvolvimento econômico em detrimento da mitigação das emissões. O Brasil enfrenta pressões internas contraditórias entre o agronegócio, a mineração e a conservação ambiental. Essa heterogeneidade interna é um dos maiores desafios para a construção de uma política ambiental coordenada.

Em síntese, os BRICS podem contribuir para a ordem climática global se articularem cooperação, investimento sustentável e justiça ambiental. Para isso, precisam construir mecanismos legais que respeitem sua diversidade institucional e garantam direitos socioambientais. A regulamentação da extração, a fiscalização de projetos energéticos e a proteção de defensores ambientais devem estar na agenda comum. Além disso, devem criar indicadores próprios de desempenho ambiental que complementem métricas ocidentais. O Sul Global exige soluções legítimas, equitativas e eficazes, que reflitam sua realidade e não reproduzam modelos alheios. O Brasil tem a responsabilidade histórica de liderar essa transformação com visão e firmeza.

André L. Tejerina Queiroz (Ph.D.)

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