O sujeito me engana que eu gosto

Vê se acorda cidadão

O poeta Leôncio Queiroz, nesta sexta-feira vem nos presentear com um poema sensacional, classificado como social engraçado por ele, que se chama “O sujeito me engana que eu gosto”. Uma alusão aquele personagem do saudoso comediante Jô Soares, Tavares. Então convido você a ler esse poema maravilhoso, aqui na Coluna POESIAS.

O sujeito me engana que eu gosto.

Na oficina me engana que eu gosto

O sujeito apaixonado,
Confunde amor com paixão;
Arriado os quatro pneus,
Não enxerga a palma da mão;
É o sujeito me engana que eu gosto,
Vê se acorda cidadão.

Tem produto em promoção,
Pela metade do preço;
Às vezes está estragado,
Vencido o prazo, é grotesco;
É produto me engana que eu gosto,
Deixa a gente pelo avesso.

Devia trocar a peça usada,
E sempre mostrar ao dono;
Trocou a usada pela nova?
A dúvida gera abandono;
Na oficina me engana que eu gosto,
Enganar é igual, é sinônimo

O cabra influenciado,
É aquele sujeito vazio;
Qualquer ideia lhe leva,
No perigo, está por um fio;
É o sujeito me engana que eu gosto,
Sem personalidade, sem brio.

Ele me engana e eu gosto

As aparências me enganam,
Não me importa a essência;
Vivo sempre hipnotizado,
Não enxergando a decência;
Aparência me engana que eu gosto,
Vivo ingênuo, na inocência.

Existe o mentiroso pronto,
Aquele profissional;
Faz da mentira verdade,
Gesticula, rebola, é boçal;
Ele me engana e eu gosto,
É o famoso «cara-de-pau».

Quanto maior o chapéu,
Menor o tamanho da fazenda;
Cachorro que late não morde,
Quem muito fala, inventa;
Quando o cabôclo me engana e eu gosto,
A verdade pede clemência.

Tem notícia pela metade,
Vejo lá na televisão;
Sei, tá faltando um pedaço,
Esconder de mim, é traição,
A notícia, me engana e eu gosto
Faço papel de bobão.

O governo me engana e eu gosto

É imposto pelas tabelas,
Embutidos nas mercadorias;
A metade do meu salário,
Vai pro governo de fantasia;
Ele me engana e eu gosto,
Dessa velha covardia.

O hospital está pronto,
Mas falta remédio e doutor;
Tem propaganda no vídeo,
E mil doentes no corredor;
Eles me enganam e eu gosto,
A saúde está um horror.

O governo é um grande Cassino,
Tem jogos que é um colosso;
Mas, proibi o Jogo do Bicho,
Alegando alvorosso;
O governo me engana e eu gosto,
Come a carne e rói o osso.

Eu vendo meu voto bem caro,
Pensando em levar vantagem;
Enganar aquele político,
Que vive de malandragem;
Ele me engana e eu gosto,
É eu e ele sem qualidade.

Na emoção e na manha,
Político promete tudo;
São promessas de campanha,
No palanque vale tudo;
Ele me engana e eu gosto,
Depois some e eu fico duro.

A economia me engana e eu gosto

Vivendo na ditadura,
Na disfarçada democracia;
Quem tá no poder faz festa,
Gastam tudo na orgia,
Sou o eleitor me engana que eu gosto,
Pago imposto que dá agonia.

País, sem oposição,
Não é mais democracia;
Todo o Congresso comprado,
Faz o papel de tapia;
É o país me engana que eu gosto
É ditadura noite e dia.

Tem professor faz de conta que ensina,
O aluno faz de conta que aprende;
A despesa da escola pública é alta,
É o dobro da particular, compreende?
O governo me engana e eu gosto,
Educação não sai do lugar, não ascende.

O comércio pelas tabelas,
A indústria na sangria;
Os bancos, bilhões de lucros,
Na mais clara anarquia;
A economia me engana e eu gosto,
Não ver nada disso, é miopia.

Placebo é remédio falso,
A embalagem é bonita que exorta;
Dentro não há nada que preste,
Só vender é o que importa;
Placebo é me engana que eu gosto,
Tem indústria safada que produz e exporta.

Diz que chegou no clímax,
Grita e treme de alegria;
É um reboliço tão grande,
Parece verdade a alquimia;
Ela, me engana e eu gosto,
Pra satisfazer a magia.

O auto-engano é uma onda,
Que tenho dentro de mim;
Quero ser o que não sou,
Não sou bala nem fes..m;
Eu sou besta, me engana que eu gosto,
Devia conhecer primeiro a mim

Leôncio Queiroz

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