A taxação sobre os super-ricos e o jeitinho brasileiro

Uma ideia da esquerda?

Na semana passada, a BBC Brasil postou o seguinte artigo ‘Taxar super-ricos não é mais ideia só da esquerda’: os argumentos de milionário americano que quer pagar mais imposto. Segundo Morris Pearl, ex-diretor da BlackRock e presidente da organização Patriotic Millionaires, o sistema de tributação nos Estados Unidos acaba favorecendo os mais ricos, já que os impostos em cima de bens e investimentos são mais baixos que aqueles cobrados sobre os próprios salários. 

Pearl acrescenta que os ricos costumam deixar o dinheiro parado, em contas bancárias, por exemplo, em vez de aplicado na economia. O artigo mostra ainda os seguintes dados: entre 2010 e 2018, famílias bilionárias norte-americanas teriam pago em média 8,2% de seus ganhos em imposto de renda, enquanto que, em 2022, um trabalhador solteiro de renda média pagou 30%. É o famoso dito “o rico cada vez fica mais rico e o pobre cada vez fica mais pobre”. 

Morris Pearl compartilhou as suas teorias no Brasil, na ocasião do Fórum Internacional Tributário, no final do mês passado. E, no dia 1° de setembro, o governo começou a explicar nas redes sociais como funcionará a taxação de super-ricos no Brasil. 

O abismo social e suas origens

Esse sistema não costuma funcionar de maneira muito diferente em outros países capitalistas. Inclusive, quando falamos de nações subdesenvolvidas ou emergentes, dentro desse mesmo regime, normalmente ainda nos deparamos com situações agravantes, como um sistema de corrupção altamente irrigado. Algo que não acomete apenas a esfera pública, mas que faz parte da educação, da essência, de todas aquelas pessoas que compõem determinada nação. 

Em seu Hello, Brasil!, o psicanalista e escritor Contardo Calligaris traz a análise da civilização brasileira. Uma sociedade construída a partir de uma colonização extrativista, ou seja, a partir de colonizadores que exploram e de colonos e escravos africanos que são explorados. Um Brasil que, em fantasia, faz uma promessa de acolhimento, mas que acaba decepcionando, uma vez que não atende a expectativa daqueles que ali chegam. Então, geram-se os slogans: “esse país não presta”, “o país do futuro” – tendo nas entrelinhas: um futuro que nunca chega – e o famigerado “jeitinho brasileiro”.

Chegada de exploradores a um novo território

Calligaris faz uma reflexão sobre as possíveis origens dessas expressões que estão constantemente saindo da boca do próprio brasileiro. Expressões de revolta, de esperança e de recalque. Mas que, no fim das contas, traduzem o desespero por um reconhecimento. O reconhecimento do colono como brasileiro, um branco escravizado por seus semelhantes; daqueles que trabalham e querem ser gratificados dignamente. O reconhecimento “em uma sociedade em que é fácil ser insignificante”, em que “um privilégio indevido pode servir para restituir a qualquer um, por um instante, uma necessária dimensão de dignidade.”. Novamente, o tal do reconhecimento, tema também abordado aqui em Expressões: a arte e a coragem, Apocalipse Zumbi: uma solução para a selvageria e Por que fazem corpo mole? Entendendo a dialética do reconhecimento.

A história e seus sinais

Lembre-se: um povo conta a sua história a partir do que tem. Não que não seja possível mudar. Mas toda mudança requer um entendimento, uma compreensão sobre a fundação do problema. Da mesma forma que em um tratamento psicanalítico é preciso retornar à infância, em uma mudança estrutural, é preciso voltar ao passado e simular a construção de uma sociedade. Afinal, o buraco é sempre mais embaixo. E, pra variar, não existe receita de bolo. Cada país terá que descobrir a fórmula eficaz de fazer a sua economia girar de maneira salutar tanto para o dinheiro quanto para as pessoas. 

Afinal, Morris Pearl demonstra uma angústia plausível “Estamos preocupados com a perspectiva de que muito em breve, em algum momento, as pessoas não aguentem mais isso.”. E um sinal disso é que os transtornos mentais são a terceira maior causa de afastamento do trabalho no Brasil.

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1 comentário em “A taxação sobre os super-ricos e o jeitinho brasileiro”

  1. Acredito que o sistema seja o mesmo em todos os países da forma que foi montado. Porém, sempre reflete as crenças particulares de cada cultura. Mas é um sistema injusto e global. Os super ricos lavam dinheiro direto em paraísos fiscais, muitos deles europeus. Por isso cultura TB não explica certos comportamentos que em sua raiz são humanos. Bom post e ótima reflexão!

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