Empurrando a morte com a barriga

Possíveis significados para a morte

Eu costumo dizer que nós temos essa mania desafortunada de empurrar a morte com a barriga. Diferentemente de outras culturas, as orientais, por exemplo, que valorizam a velhice e o idoso, a sabedoria, o acúmulo de experiência de vida. Nesses lugares, cada ruga é vista como um presente, algo que se conquista com o passar dos anos. Quanto mais idade uma pessoa tem, mais afortunada ela é.

O dia de finados no México é conhecido como o día de los muertos. Enquanto na maior parte das culturas ocidentais, o 2 de novembro é um dia para visitar túmulos e lamentar a morte de entes queridos, no México, os primeiros dois dias de novembro se transformam em festa. Trata-se de uma grande celebração com “o objetivo de demonstrar amor e respeito pelos mortos”. Tão importante para valorizar a vida indígena – inclusive, tendo os astecas como um de seus ancestrais -, acabou sendo reconhecido pela Unesco como patrimônio cultural. Para saber mais sobre essa data festiva, acesse o artigo da National Geographic, 10 coisas para saber sobre o Dia dos Mortos.  

Há controvérsias

As pessoas costumam associar qualquer assunto que envolve a morte a um significado negativo de morbidez: “que papo mórbido!” e simplesmente mudam de assunto. Apesar de repetirmos constantemente frases como “a única certeza que temos é a da morte” e respondermos negativamente para perguntas como “você gostaria de viver para sempre?”, a prática se mostra um pouco controversa. Afinal, não falamos sobre a morte, e, dessa forma, os nossos familiares ficam sem saber sobre que fim gostaríamos que o nosso corpo tivesse, as crianças ficam sem uma explicação coerente sobre aquele que partiu ou sobre a possibilidade de seus pais não estarem mais presentes, os doentes que amamos, em fase terminal, ficam sem saber que estão próximos do fim e todos perdemos a chance de sermos e fazermos alguém mais feliz. Nem que seja apenas por alguns instantes.

Só mais uma etapa

O fato é que a morte é só mais um estágio da vida: nascemos, crescemos, envelhecemos e morremos. E sabemos que nem sempre as fases de crescimento e de envelhecimento duram tanto quanto se espera da estatística. Afinal, somos seres mortais e vulneráveis tanto a interferências externas quanto internas. Um ciclo tão bem aceito para as plantas que cultivamos em nossas hortas, mas com o qual não sabemos lidar quando se refere àquela pessoa com a qual convivemos. Incluindo nós mesmos.

Ainda há esperança!

Mas há quem faça questão de falar sobre a morte! O Death Cafe é uma franquia social criada pelo antropólogo e sociólogo suíço Bernard Cretazz com o intuito de “aumentar a conscientização sobre a morte visando ajudar as pessoas a fazer o máximo de suas vidas (finitas)”. A iniciativa teve tanta aceitação que se espalhou pelo mundo e, hoje, é uma organização internacional, em que pessoas de uma comunidade se encontram mensalmente para tomar um café enquanto falam das suas experiências e angústias em torno do tema. Para saber mais sobre, leia na íntegra o texto da Academia Nacional de Cuidados Paliativos, Café, bolo e um dedo de prosa sobre a morte.

Ao empurrarmos a morte com a barriga, empurramos também a vida. Adiamos o nosso presente, as nossas vivências. Vivemos de futuro, de planos e projetos. Estamos fadados ao destino. Passamos por cima de tudo aquilo que está disponível para nós neste exato momento. Por outro lado, quando aceitamos a morte como mais uma etapa disso que chamamos de vida, passamos a valorizar o agora. O descanso agora. A atenção agora. O amor agora. Afinal, amanhã, de fato, pode ser tarde demais. 

Sabe aquela história do “morreu feliz”? É isso. E você, como está vivendo? Da melhor forma que você poderia?

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