Assim caminha a humanidade…
Antes de engravidar, pegava-me perguntando que rumos a civilização está tomando e se valia a pena trazer mais uma pessoa a esse mundo, que o Veda chama de hospício. Lendo o que a mídia anunciou ser a última mensagem do papa Francisco – “a paz é possível” – e pensando no próximo assunto para esta coluna, dei-me conta que nas últimas semanas a minha escrita vinha sendo, não digo pessimista, mas, talvez, venha depositando pouca esperança no leitor…
Mas o que fazer, se as últimas notícias têm exibido um mundo caótico? Guerras sem fim; os mais elevados índices do que chamam de feminicídio, crimes cibernéticos, infanticídios, bullying, suicídios, crimes cometidos por crianças, crimes sexuais; a direita contra as diversidades – que, querendo ou não, aumentam a cada dia –; a esquerda contra o capitalismo – que, querendo ou não, torna-se cada vez mais perverso -; inflação e preço dos alimentos em disparada; a crescente de diagnósticos em autismos, bipolaridades, ansiedade e depressão; e tantas outras.
Por que esperar resultados diferentes se fazemos sempre o mesmo?
O mundo enlouqueceu de vez ou será que apenas não tínhamos tanto acesso à informação? Será que esse excesso de informação tem travado os nossos sistemas psíquicos? Então, por que temos fugido das responsabilidades? Por que temos tanto horror à possibilidade de não sermos amados ou de sermos odiados? Por que passamos tanto tempo, como zumbis, olhando as nossas redes sociais, sem sequer nos darmos conta que somos como espelhos para as nossas crianças?
Não, não existe nenhuma solução prática para as relações humanas. Nós somos seres complexos, o que requer uma solução complexa ou, no mínimo, trabalhosa. Manter os filhos em casa não é nem nunca foi solução. Afinal, os maiores perpetradores de crianças são e sempre foram os membros da própria família. Lei Maria da Penha mais lei de feminicídio não foram capazes de conter o crescimento de casos. As ferramentas tecnológicas de avaliação de risco de violência doméstica utilizadas pela polícia europeia não foram capazes de prever com eficácia a morte de Lina, na Espanha, que foi classificada como “risco médio” para feminicídio.
O que será que será..?
Será que se trata realmente de homens contra mulheres? Ou tratar-se-ia de uma cultura machista que alimenta todos os dias homens, mulheres e crianças? Será que se trata de supremacia branca ou tratar-se-ia de supremacias, de ganância e perversão, que acometem todos os indivíduos – branco, negro e amarelo? Será que se trata do homem hetero-cis-normativo contra o resto da humanidade ou tratar-se-ia da intolerância e do desconhecimento de causa sobre os nossos próprios corpos dos quais todos somos reféns? Todos, homo, hetero, cis, trans e derivados. Afinal, toda transformação é, de fato, sinal de fluidez?
A vida devia ser bem melhor e será?
Sim, pensar dá trabalho. E andamos com as mentes tão ocupadas focando no ter mais e no parecer algo que não somos, que acabamos deixando de lado o principal: a vivência, as trocas, as reflexões, o permitir-se fluir. Como um rio, que corre, percorre, recolhe, deixa ir, desagua, mistura-se, incorpora.
Heráclito dizia que ninguém entra no mesmo rio duas vezes. O problema é que preferimos as piscinas. Água parada, que acumula a sujeira de quem por ela passa. Se viver é ser como um rio, não deveríamos nos apegar menos a coisas, pessoas, sentimentos e, inclusive, ideologias? Pois é, acredito que esse seja o real desafio por trás da missão de chegar ao pote de ouro no fim do arco-íris. Acho que por isso optei pela reprodução. Porque me parece que o caos é apenas a cortina de fumaça pro desafio que é viver. Dito isso, não sei se a paz é possível, mas sei que é possível viver apesar da tal paz que tanto almejamos para a humanidade e que nunca vem.
Se viver é o que tem pro almoço, então, por que não?