Cérebros que encolhem: a complexidade da verdade

Por que os cérebros humanos estão encolhendo?

No texto da semana passada, A crise do belo em Rousseau e Agostinho, pudemos refletir sobre o lugar da beleza bem como do intelecto dentro de uma sociedade. Vimos o quanto que a necessidade do belo ainda prevalece e a urgência de colocarmos à prova a inteligibilidade humana. “Estamos nos tornando menos inteligentes?”, questiona artigo da BBC, O mistério sobre por que os cérebros humanos estão encolhendo.

“Os cérebros dos humanos modernos são cerca de 13% menores do que os do Homo sapiens que viveu há 100 mil anos.”, afirma o artigo, apontando ser uma questão ainda intrigante para os pesquisadores. Afinal, o nosso “grande cérebro” seria o maior marcador de diferenças entre a raça humana e os outros animais.

O cérebro humano quase quadruplicou de tamanho nos seis milhões de anos desde que a nossa espécie partilhou pela última vez um ancestral comum com os chimpanzés. No entanto, estudos mostram que esta tendência para cérebros maiores se inverteu no Homo sapiens.
Teorizando

Existem diversas teorias que tentam explicar esse fenômeno e todas elas entram em contradição em algum ponto, especialmente quando se tenta checar datas. O cientista Jeff Stibel do Museu de História Natural da Califórnia, por exemplo, acredita que a redução do tamanho do cérebro tenha a ver com as mudanças climáticas, pois, com o aquecimento da Terra, grandes cérebros demorariam muito para esfriar.

O cérebro é o maior consumidor de energia de todos os órgãos, pois pesa cerca de 2% da nossa massa corporal, mas consome mais de 20% da nossa energia metabólica em repouso. Provavelmente também deveria se adaptar ao clima. Nossa teoria é que cérebros menores dissipam melhor o calor e também têm uma produção de calor reduzida.

Entre outras teorias, estaria também aquela proposta pelo paleoantropólogo do Museu Americano de História Natural de Nova York, Ian Tattersall, sobre o “processamento de informação simbólica”, seguido da “invenção espontânea da linguagem”.

Isso fez com que as vias neurais do cérebro fossem reorganizadas de uma forma mais metabolicamente eficiente, permitindo que os humanos obtivessem maior “retorno do seu investimento”. Em outras palavras, à medida em que cérebros menores e mais bem organizados foram capazes de realizar cálculos mais complexos, cérebros maiores e metabolicamente caros tornaram-se simplesmente desnecessários.
Do desconhecido às formulações

É interessante notar que tanto Stibel quanto Tattersall defendem teorias fundamentadas na termodinâmica. E podemos facilmente associá-las à revolução das máquinas com a nanotecnologia: equipamentos cada vez menores e mais funcionais. Em Psicanálise, também nos baseamos nas leis da física para tentarmos explicar as pulsões e o mecanismo de economia libidinal. O que quero dizer com isso é que buscamos o entendimento sempre a partir de algo que já conhecemos.

Mas quando se trata de retornar milhares de anos atrás, muitos detalhes ficam perdidos. Entramos, então, no desconhecido, e nos mitos. E, para que a teoria se torne mais viável, retornamos a épocas mais recentes, como fazem Stibel e Tattersall, remontando a 17 e 3 mil anos atrás respectivamente.

O Veda
Figura divina na cultura védica

Com a mitologia, a cultura védica se espalha pelo oriente, incitando a busca pela Verdade Absoluta. Acredita-se que ela tenha surgido há cerca de 5 mil anos. Ou seja, antes mesmo da escrita. Esse conhecimento teria sido transmitido na oralidade, decorado e checado diversas vezes entre guardiões ao longo dos anos.

Do Veda, nasce o Yoga, para se estudar a mente. Em sânscrito, Yoga poderia ser traduzido em: fusão de todos os pares de opostos – sol e lua, masculino e feminino, bom e mau (por que não?). Para essa filosofia de vida, a dualidade não é, digamos, bem vista e, portanto, a ideia é que os opostos se dissolvam e se transformem no uno. A questão é que, se o Veda, de fato, teve origem 5 mil anos atrás, ele teria surgido não somente antes da escrita, mas antes mesmo da linguagem.

A verdade da complexidade

Quando Ian Tattersall remonta a 3 mil anos atrás, ele vai a um período posterior à origem do Veda. E quando ele cita a linguagem, podemos nos referir à fala em si, ao processo de comunicação através da fala. Porque a linguagem da qual falamos em Psicanálise se trata da linguagem moderna, baseada em simbolismos ou representações inconscientes. Uma linguagem que carrega equívocos, que provoca impasses. Pois a linguagem moderna ocorre de um significante a outro significante e não mais de um significado a outro significado. Aqui, incluímos as percepções e interpretações. E é nesse novo processo que ocorrem as contradições e, portanto, a dualidade: amo e odeio, bom e mau, belo e feio. A Verdade Absoluta, portanto, no oriente, dá lugar à “verdade relativa”, no ocidente. Em vez de se reter, coloca-se pra fora. Em vez do silêncio, pratica-se a fala.

Assim, o primeiro fato é que o cérebro humano segue encolhendo. O segundo fato é que quanto mais complexo o nosso vocabulário, mais complexo é o nosso entendimento. Ou seja, o entendimento sobre a vida tem se tornado cada vez mais complexo, significando que para se chegar até lá é preciso fazer um esforço muito maior. E um esforço sem garantias. Será que não estamos espremendo demais as nossas mentes para chegarmos a um sentido, a um propósito e, finalmente, podermos gozar da vida?

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