Mais um retorno ao passado…
Parece que o retorno ao passado tem sido mais corriqueiro do que nunca. Na última semana, aqui na coluna, abordamos os novos-antigos hábitos alimentares, que entram na busca incessante pela saúde física e mental nos dias atuais, não como forma de prevenção, mas de remediação. As buscas desesperadas fazem parte de uma onda de insatisfação, seja com os estados de saúde que nos impossibilitam de participar parcial ou totalmente das atrações que a nova era nos oferece, seja com as leis que nos obrigam a tolerar as diferenças dentro de uma sociedade.
Ontem, foi anunciado que o CDU (União Democrata-Cristã), partido de centro-direita na Alemanha, venceu as eleições parlamentares. Junto a isso, “a legenda de direita radical Alternativa para Alemanha (AfD) ficou em segundo lugar” e a coalisão de centro-esquerda, SPD (Partido Social-Democrata), caiu da liderança para o terceiro lugar.
O mundo volta seu olhar atento para a ascensão da direita. E não é como se isso fosse uma novidade. A alternância de poder entre direita e esquerda sempre existiu. É como um jogo de equilíbrio: quando um parece radical demais, vem o outro e promove uma espécie de castração.
Radicais de direita
No inicio de fevereiro, a BBC News trouxe o artigo Por que cada vez mais jovens alemães estão aderindo à direita radical. Esse crescimento do viés de direita “acontece em um momento de ansiedade cada vez maior entre os jovens”, segundo estudo do Instituto Alemão de Pesquisa Geracional.
Em uma amostra de mil alemães com idades entre 16 e 25 anos, os níveis de ansiedade foram mais altos entre os entrevistados que se classificam como de direita radical, e mais baixos entre aqueles que se situam no centro do espectro político.
No entanto, há diferença considerável entre as preferências das jovens mulheres e dos jovens homens.
As mulheres eram mais propensas a se preocupar com seus direitos e com os direitos de grupos minoritários, enquanto os homens estavam mais preocupados com os valores conservadores…
Radicais de esquerda
“…os partidos de esquerda geralmente se concentram em temas como feminismo, igualdade e direitos das mulheres”, tanto na Alemanha quanto no resto do mundo. É como se os homens se sentissem de alguma forma desamparados – leia mais em A fragilidade dos sexos na era do empoderamento feminino e das machosferas.
O machismo e o patriarcado começam a perder força e, com os radicalismos de esquerda, aqueles que se identificam na primeira categoria acabam esbarrando numa incompreensão sobre qual será seu novo papel, seu novo lugar, dentro dessa nova ideologia. E o medo de perder essa posição é equivalente ao medo da morte.
Por isso há tantos radicalismos de ambos os lados. É matar ou morrer. Assim, tentamos cortar o mal pela raiz. Para que não coloque em risco as nossas vidas, ou melhor, as nossas posições no mundo, “nunca mais”.
Radicais do sagrado..?
Paralelamente aos radicais, numa outra via de resolução, estão os jovens que vivem um retorno ao sagrado, conectando-se com “a religiosidade, o sagrado e o metafísico”. O sociólogo francês Michel Maffesoli, professor da Universidade de Sorbonne, “popularizou o conceito de ‘tribo urbana’ – agrupamentos sociais espontâneos unidos por um estilo de vida”.
…após um processo de secularização (afastamento da religião ou perda da sua relevância) da sociedade ocidental — especialmente na filosofia, na produção dos conhecimentos e nas artes — a conexão com algum tipo de espiritualidade passou a fazer falta.
O retorno ao sagrado pode, então, acabar se tornando uma via de fuga tanto dos racionalismos quanto das sedações da contemporaneidade. Afinal,
A hiperexposição à violência e às perversidades, nas suas mais diferentes formas, apresenta um real com muitos furos, o vazio insuportável de uma vida precária. Assim, só nos resta fugir dessa realidade nua e crua. Ou seja, apesar de, com o tempo, o direito de gozo ter sido liberado, mais uma vez, ele não se regula, pois com o gozo, “também se liberam o ódio e suas formas mais arcaicas de segregação e de impulso de morte.
Afinal, o gozo nos persegue, seja na direita, na esquerda ou no sagrado. E, com ele, os vícios, os excessos, os radicalismos. Passamos a fazer a escolha do que é menos ruim. É excesso de que?