
Uma queimadura que deixou lições
Sofri uma pequena queimadura em meu dedo anelar, o que me tirou a paz! Essa semana, estava em casa correndo contra o tempo, pois acabara de chegar do Brasil na quarta e no domingo já tinha um cruzeiro marcado. Então, comecei a fazer tudo no automático e com muita pressa, o que não é prudente.
Quando estava cozinhando, coisa que tenho prazer em fazer, em meu fogão elétrico que não tem chama, apaguei a boca e, na pressa, comecei a limpar pequenas manchas. Momentaneamente esqueci que a superfície estava quente e queimei meu dedo. Foi uma queimadura pequena, mas muito dolorosa. Corri e coloquei creme dental para a bolha não subir e fiquei com a cara de choro o resto do dia.
Por pequena que foi, a queimadura me incomodou bastante. Não subiu bolha, mas aquela dor me desconcentrou e atrapalhou minha rotina corrida.
Tentei me conscientizar dizendo a mim mesma que já tinha suportado dores piores, o que não aliviou o desconforto. O remédio, supus, era esperar o tempo passar e levar aquela sensação ruim embora.
As queimaduras da vida
Resolvi filosofar em cima da pequena queimadura. Ora, se eu filosofo até vendo uma barata passar, não ia sentir uma dor “de graça.” Alguma lição haveria de extrair dela.
Fiquei pensando que, durante nossa vida, esbarramos em coisas minúsculas que por insignificantes que pareçam, nos incomodam e até nos roubam a paz.
Não sei vocês, mas sou uma pessoa que preciso aprender a deixar coisas passarem, mas ainda não adquiri essa virtude. Eu me acho rancorosa, apegada a detalhes, uma pessoa inflexível nesses aspectos. Gosto de cobrar os centavos da vida. Melhorei um pouco, mas ainda me reconheço assim e assumo tal característica sem vergonha nenhuma.
Fico pensando nas trapaças que pessoas me fizeram ao longo da vida e me revolto. O perdão vem, mas de uma forma muito difícil e lenta. Isso me atrapalha muito, mesmo sabendo que saída mais inteligente seria deixar para lá.
Um descuido pode gerar uma dor.
Ser descuidada, para mim, é uma falho. Durante minha vida inteira, procuro ser zelosa com as coisas e pessoas que convivo e, muito inocente, espero o mesmo delas. Se uma pessoa faz algo comigo, eu tenho-a como descuidada e assumo que não tenho a mesma importância que dou à ela.
Quando isso acontece, eu corto os laços, me distancio, mesmo que doa mais em mim, mas é uma forma de autocuidado e de “ser justa” com a pessoa e comigo mesma.
Tenho para mim, que a essa altura da vida eu não posso mais permitir que me firam. Quando eu mesma consigo me machucar, como foi no caso da minúscula queimadura, eu passo o dia me maldizendo, pensando em como fui relapsa, como fui descuidada e até para me perdoar é difícil.
Na vida é a mesma coisa: se eu faço uma interpretação errada de uma pessoa e isso acaba mal, é somente a mim mesma que culpo, afinal, a pessoa estava apenas sendo ela mesma. Eu que fui descuidada e deixei que me atingisse. Eu já passei da idade de me enganar (penso), então levo tudo muito a sério.
Esse modo de ver a vida eu não recomendo para ninguém, afinal, estamos sujeitos a vivenciar situações boas e ruins, como seres sociáveis. Precisamos ter sabedoria em deixar certas coisas como dores, frustrações, decepções passarem sem se prender ou se estender nelas. É aquele ditado “soltar dói menos que segurar.”
Não existe uma pessoa não tenha experimentado o “amargo” da vida, como uma decepção, uma contrariedade, ou algo similar. Por que seria diferente conosco?
Coisas insignificantes que incomodam
As coisas pequenas me remetem a uma história infantil de uma princesa que se sentiu incomodada por um grão de ervilha, mesmo estando deitada sobre uma pilha de colchões macios de pena de ganso colocados propositalmente por um estalajadeiro para saber se a princesa era mesmo da realeza ou se fingia. Ao deitar, a princesa sentiu de imediato o incômodo, pois não era acostumada com algo minúsculo como um grão de ervilha lhe incomodando.
O fato de sentirmos o incômodo por uma pequena mentira, um troco de centavos que não nos dão, uma promessa quebrada não é errado. Isso só mostra que fomos criados com a realeza dos bons costumes, da hombridade, com o que é correto.
Infelizmente, pessoas mal intencionadas começam a nos testar com pequenas coisas que, se não dermos um basta, se tornam grandes incômodos. O x da questão é saber se suportamos ou até onde podemos suportar, o que também é uma forma de se autoconhecer, afinal, não precisamos aceitar o que quer que seja por medo de desagradar outrem.
O poder de cura que temos
Em contrapartida, temos o poder de sair daquela situação que nos machuca e de curar a si mesmo. Foi o que fiz colocando creme dental em minha queimadura (funciona de verdade). Ardeu na hora, mas quando já era noite, não sentia mais dor, apenas a pele do dedo ficara mais grossa. Cicatrizes podem ser inevitáveis, mas nos lembram de nosso poder de resiliência e superação.
Sem querer estender a filosofia da queimadura, meus amados leitores, finalizo dizendo que, por vezes, as dores, por pequenas que sejam, são inevitáveis e nem sempre serão por nossa culpa (embora eu seja aquela megera comigo mesma que me culpo por tudo).
O mundo é habitado por diferentes mentes e nem todas são conectadas ou sintonizadas da maneira que nós gostaríamos e nada podemos fazer sobre isso.
O que devemos a nós mesmos e estarmos atentos aos sinais, procurar nos precaver de surpresas desagradáveis e, se acontecerem, nos curar do que quer de ruim que tenha ficado em nossas vidas. Sair. Bater a porta. Não voltar mais.
Apesar de tudo, devemos manter a boa-fé, fazendo nossa parte e, como diz Ivan Lins, acreditando que “a vida pode ser maravilhosa.” Seguir, mesmo com pequenas dores, queimaduras, desamores, dissabores… Como leitora e escritora, gosto de pensar que “no próximo capítulo, as coisas melhoram.”
Agora me falem de uma coisa pequena que lhe tira a paz. Pode ser no sentido figurado ou não.
O que me tira s paz, é quando quero ficar só, em sintonia comigo mesmo e alguém chega
Rindo aqui, pois também não gosto. Infelizmente, nem toda visita inesperada é boa, principalmente quando estamos nos desconectar de tudo para ficar em nossa companhia.
Faz parte.
Um grande abraço, minha amiga Edilza.
As queimaduras que vêm em forma de palavras ou atos doem mais do que queimaduras feitas com fogo, pois depois de algum tempo dependendo do grau seu corpo (Pele) recupera seu estado, já as lesões que ficam na mente ou no coração que são absorvidas através de atos ou palavras imprudentes, preconceituosas e/ou sem noção as vezes ficam queimando no coração e na mente de quem as escuta e/ou sofre. Parabéns por mais uma crônica genial. Meu dia favorito era o Sábado, agora decretei que é a Terça-feira, pois tem sempre uma crônica pra ler nos meus teeeeeeeeempos vagos. Obrigado, amiga Veridiana. “Você” mora no meu coração.
Obrigada meu amigo querido e poeta, Pablo.
Eu sei como são essas queimaduras na alma, realmente doem e deixam marcas profundas, mas devemos sempre levantar a cabeça e seguir. Viver sempre será o melhor remédio para tudo.
Obrigada por ter mudado sua preferência do dia. Aumentou minha responsabilidade. Adoro ler lida por você, que é uma alma sensível.
Um grande abraço!!!
Mais um texto maravilhoso, que nos dá prazer de ler e nos leva a pensar. 👏🏻👏🏻👏🏻👏🏻👏🏻
Obrigada, minha irmã. Beijos afetuosos!
A filosofia cotidiana da vida é sempre rica em camadas e mais camadas que famos descobrindo. No fim de semana a Isabela caiu da bicicleta. Tratei o ferimento na perna, acalmei, acolhi e disse “só cai de bicicleta quem anda de bicicleta”. A vida tem momentos de dor e só doi para quem vive. O perdão funciona como um curativo em um ferimento, mas perdoar não é o mesmo que esquecer. Se vale a pena, o diálogo sempre é a melhor resposta. Se não vale a pena, a melhor resposta é o afastamento. E vida que segue. Como muito dito recentemente “a vida presta”, ainda que com alguns tombos ou queimaduras no decorrer. 😉 Adorei as muitas reflexões de sua crônica.
Oi, minha amiga querida. Abraços afetuosos para Isabela e que isso não a impeça de andar muitas vezes de bicicleta.
É verdade que o perdão nos libera de muitas coisas e por isso, devemos sempre praticá-lo e quando o convívio é impossível, o melhor é mesmo se afastar. Obrigada pelo complemento de meu texto.
Obrigada sempre pelo seu apoio como amiga e escritora.
Beijos para vocês!