Janelas

As janelas da alma

Tem uma frase que sempre que a leio, me pego meditando: “os olhos são as janelas da alma.” Ela é atribuída a Edgar Allan Poe, um brilhante poeta e escritor americano. Não sei lhes afirmar a autoria, mas confesso que fico pensando em nossa alma, como uma força presa dentro de nosso corpo, apenas com nossos olhos para lhes guiar, como uma janela, e um coração para sentir.

Afinal, o que os olhos não veem, o coração não sente, dizem. Como exemplo, utilizo a tragédia que aconteceu recentemente no Rio Grande do Sul. Uma coisa é ler uma manchete. Outra é ver as imagens, o desespero das pessoas, através das janelas de nosso olhar. A gente se aflige junto, quer ajudar de qualquer maneira, o coração fica contrito, nossa alma se inquieta. A “coisa positiva” em tudo isso é ver um país inteiro se mobilizando para ajudar.

Nossos olhos, nossas janelas

Pois bem, meus amigos. Uma vez que uma das principais janelas que temos são nossos olhos, convém nos atentarmos para o que estamos vendo, afinal, através delas é que nascem as sensações em nossa mente, em nosso coração.

Esses dias têm sido muito intensos para mim, pois estou numa viagem de 29 dias e fazendo “viagens” dentro dela, através de excursões por onde o navio aporta. Geralmente, são monumentos que não temos como nos deslocar de onde moramos exclusivamente para visitá-los. Então, aproveitamos os cruzeiros que passam por perto para isso. É bem mais cômodo e barato.

Nas excursões é disponibilizado um ônibus que nos leva para tais lugares. Eu sempre peço para ficar na janela. Gosto de ver a paisagem, as cores, a arquitetura da cidade, o clima, as pessoas caminhando com suas diferentes expressões, etc. Sempre fui observadora. Agora, mais ainda.

Irlanda e Inglaterra

Ontem o navio ancorou na cidade de Cork, na Irlanda do Sul (que é independente do Reino Unido) e fomos visitar um castelo medieval. A época para tais passeios está propícia, pois no hemisfério norte, estamos vivenciando a primavera, onde as flores eclodem por toda parte, além do cuidado dos moradores em cultivarem lindos jardins, pequeninos ou enormes, a depender de onde moram.

Da janela, tirei muitas fotos para olhar com calma, relembrar os locais, pegar referências para futuras histórias. Algumas, preciso apagar, pois com o ônibus em movimento não ficaram muito legais, mas em síntese, enchei minhas janelas da alma de coisas bonitas.

Hoje, fomos visitar as misteriosas pedras de Stonehenge, que ninguém sabe ao certo quem as colocou lá. Elas ficam na cidade de Salisbury, Inglaterra e datam de 4 mil anos antes de Cristo. Atribuíam essas pedras aos deuses celtas e druidas, mas os arqueólogos descartaram tal hipótese, pois antes dos druidas aparecem na Inglaterra, elas já existiam.

As pedras, me lembraram a formação de janelas, quadradas, formando passagens para o sol em determinadas épocas do ano. É um mistério da humanidade. Dizem que foram feitas para se alinharem durante o solstício de inverno e verão, como se fosse um calendário celestial. Tal conhecimento serve para os agricultores e astrônomos, por exemplo.

Da janela do ônibus

Bem, mais uma vez eu fui na janela. A viagem durou umas duas horas e fomos pela zona rural da Inglaterra. Como sempre fui leitora de uma escritora muito conhecida no Brasil, Barbara Cartland, pude ver boa parte da paisagem que ela descrevia em seus livros, geralmente ambientados no interior da Inglaterra.

Meus amigos, da janela, eu vi coisas lindas, como as “cottages,” as casinhas rurais, feitas de pedras com lindos jardins de peônias, lavandas e rosas, dispostas formando um quadro. As igrejinhas com o cemitério de túmulos baixos com lápides de pedra, cheias de musgo, ao redor, o que é muito comum na Inglaterra; as casas de pedra da época georgiana e vitoriana; lindos pastos com animais como aqueles de filmes de época.

Vi também alguns cavalos com capa para o frio. A Inglaterra é também famosa pela equitação, sendo o berço de famosas corridas de cavalos, como as de Epson e Ascot, quando ninguém nem pensava em Fórmula 1.

Quando passávamos em algum lugar de destaque, a guia turística nos dizia que em tal local havia sido filmado cenas de séries da Netflix como “A Coroa,” e “Outland” bem como alguns filmes, dentre eles, “A Jovem (rainha) Vitória,” “Ammonite,” que fala de uma paleontóloga que descobriu o primeiro fóssil completo, mas por ser mulher, um homem levou a glória (baseado numa história real).

Córregos cortando as florestas verdejantes, com patos se alimentando do capim que nascia nas margens, campos de feno, e flores, muitas delas, silvestres amarelas formando imensos tapetes e muitas margaridas minúsculas nas margens da rodovia.

Inclusive, a guia nos falou que Sting, um cantor britânico, tinha se mudado para as imediações, pois sua esposa tinha se encantado com um lugar. Ele se inspirou e compôs uma de suas músicas mais lindas, “Fields of Gold” (campos de ouro) por ver a beleza dos campos de trigo. Isso é um pouco do que vi pela janela em que estava.

Nossas janelas precisam de cuidados

O que vemos em nossas janelas interferem em nossa maneira de ver o mundo, de ver a vida. As “vistas”  influenciam desde o nosso humor até nossas atitudes, modificando nosso estado de pensar e agir.

Ousaria dizer que não somos nós que vemos essas janelas, mas nos vemos através dessas janelas. Por exemplo, ao ver tanta beleza numa zona rural, me imaginei morando ali. Por um momento, vislumbrei uma pessoa que eu poderia ser, longe do agito urbano, como o cantor Sting fez.

Definitivamente, não quero aqui filosofar, mas veja, quando olhamos demais ou damos muita atenção a alguma coisa, isso acaba nos influenciando.

Então, cabe apenas uma reflexão para hoje: Que paisagens das janelas estão prendendo nossa atenção, meus amigos?

Seriam as da rotina, em casa, com nossos afazeres, nossos filhos e responsabilidades?

Ou talvez, a vista das redes sociais com aquelas “vidas invejáveis,” onde ninguém adoece, onde as pessoas são felizes e nós, acabamos nos comparando com elas?

E as paisagens que são difíceis, mas não conseguimos sair delas, aquelas onde estamos lidando com doenças, como cuidar de pessoas que dependem de nós; a do luto que não nos deixa; as da depressão, da ansiedade…

Ou seria a paisagem da janela de nosso trabalho que nos consome, mas preferimos focar nelas para não ver as demais, as nossas vistas interiores, que nem sempre nos agrada?

As paisagens de nossas janelas

Quando estamos presos em determinadas vistas, não conseguimos visualizar outras que a vida oferece e que também merecem a nossa atenção. Confesso a vocês, que por vezes, esqueço de olhar para as coisas que preciso fazer por mim, dos meus problemas e de meus medos.

Por fim, durante a viagem de volta, caiu uma chuvinha, comum no clima inglês. Frio, chuva, sol quase apagado. Até chamam de clima depressivo, mas eu até acho charmoso. Enfim, tive que ver a paisagem um pouco embaçada. Esperei a chuva passar e o vento secar os vidros.

Ao longo de nossa vida, também passamos por isso, quando os desafios nublam nossa visão. Nesse momento, devemos sim aguardar passar “a chuva”, para contemplarmos a vista, não importa em qual janela seja.

Enfim, na vida temos muitas paisagens que passam por nossas janelas, tal qual nossa casa. É preciso que cuidemos de todas. É através delas que o mundo se apresenta para nós.

Agora me falem. Vocês conseguem equilibrar todas as paisagens das janelas de vocês ou não? Se sim, me conte o segredo. Um grande abraço!

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10 comentários em “Janelas”

  1. Palavras lindas que me fazem olhar pela minha janela. Vejo o mar, e vendo o mar a imensidão do mundo eu contemplo. Um mundo de possibilidades abre-sem todos os dias pelo olhar da minha janela.
    Sua escrita é linda !
    Obrigada.

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  2. Estou viajando na sua viagem, querida!
    Que relato incrível 👏
    Somos cada vez mais consumidos de tantas informações que passam por nossas janelas.
    Saber usar um filtro, um óculos protetor e seletor faz muita diferença para nosso equilíbrio emocional.
    Um exercício tão desafiador quanto necessário.
    Grata por me proporcionar essa viagem por meio da sua janela. ❤️

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  3. Excelente relato das suas janelas. Observar e se apropriar de tudo. Diante de tantas maravilhas visualizadas em nossos passeios, fica a concepção de que o mundo e a vida é mais, tem mais e nos oferece mais. Apropriemo-nos. E que a beleza e leveza vistas destas janelas nos tragam sempre a certeza: tem mais na vida!

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  4. Aquilo que damos demasiada atenção, cresce. Aprendendo a me demorar nas janelas que edificam, as demais, que vejamos apenas de passagem. Aqui eu encontrei os olhos mais transparentes, do meu João, e é tão cheio de amor. 😍

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