O porquê dos disfarces:

Reflexões sobre máscaras sociais e a persona que usamos:

O caso que viralizou nas redes sociais

Recentemente as redes sociais foram à loucura por causa de um homem mediano, flagrado usando peruca e roupas femininas curtas, perambulando à procura de algo.

Foi filmado (afinal, nossa sociedade hoje vive de olho em tudo) e depois ameaçado de extorsão. Como não pagou o que foi pedido, o vídeo terminou nas redes sociais e viralizou. Cada postagem criava comentários jocosos, ofensivos, curiosos, porque todos queriam saber: por que aquele homem se disfarçava de mulher e andava por aí, à noite?

Um “agravante” era o fato de ser pastor de uma igreja, instituição que cobra de seus membros padrões rígidos de conduta. Quando descoberto e exposto, ele apareceu nas redes acompanhado da esposa (visivelmente aborrecida), tentando justificar que estava “procurando um endereço”. A explicação só piorou a situação: memes brotaram, criaram bonecos e kits de investigação, e até que surja outro caso bizarro, esse episódio dificilmente será esquecido.

Mas a questão que fica é: estamos vivendo realmente como gostaríamos ou, como aquele homem, também usamos disfarces?

Máscaras sociais: precisamos delas para viver em sociedade?

A psicologia chama de persona (Jung) essa máscara social que vestimos para sermos aceitos. Não é, por si só, algo ruim. Precisamos dela para conviver em grupo, trabalhar, cumprir regras. Mas quando a persona se afasta demais do que realmente somos, nasce o sofrimento psíquico, a sensação de viver uma vida que não nos pertence.

E se as regras sociais não existissem, como seríamos? Mostraríamos o rosto nu, sem máscaras, sem afetações? Ou viveríamos na selvageria, sem nenhum freio?

Desde que nascemos, aprendemos que há consequências em não cumprir as regras sociais: exclusão, julgamento, isolamento… e, nos tempos atuais, o famoso “cancelamento”. Por isso, criamos códigos e papeis que, muitas vezes, não revelam nossa essência.

O desejo de ser outro: entre a sombra e a autenticidade

Do caso em questão, algumas lições surgem: o homem buscava experimentar outra versão de si mesmo. Na psicologia, isso se aproxima do contato com a sombra, que reúne os impulsos e desejos que escondemos até de nós mesmos. Negar essa parte é viver em conflito interno; encará-la é um passo para a maturidade.

Quantos de nós não desejamos, em algum momento, ser outra pessoa? Viver outra vida, ocupar outro papel?Eu mesma adoraria ser, por um dia, a atriz Monica Bellucci, mas acostumei-me a ser eu mesma, e gosto muito de ser eu.

Querer ser diferente do que se espera está tudo bem. O problema é quando vivemos uma vida secreta paralela, escondida até das pessoas mais próximas.

Veja que, quando pego de surpresa, o homem não assumiu seu disfarce — colocou a esposa como escudo, um comportamento infantil que vemos se repetir em tantas situações: erram, mas chamam alguém para proteger a própria imagem.

Na psicologia, isso revela uma dificuldade em assumir a responsabilidade pelos próprios atos. É duro encarar a sombra — esse conjunto de desejos, falhas e impulsos que escondemos até de nós mesmos. Mas só cresce quem olha de frente para a própria sombra.

O disfarce que usamos todos os dias:

Talvez o verdadeiro disfarce não seja o de quem foi filmado usando roupas femininas, mas o que todos usamos no cotidiano: a máscara de eficiência, paciência, coragem ou motivação, a de super humo (a) quando, por dentro, muitas vezes queremos apenas descansar ou ser diferentes do que esperam de nós.

No fundo, todos carregamos disfarces. Uns mais visíveis, outros mais sutis. A questão é: se ninguém nos julgasse, que aventura ousaríamos viver?

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