Alicerces

Alicerces do Castello di Pentefur, Sicília, Itália.

Esses dias tenho viajado bastante pelo velho mundo. É verão na Europa. Um calor terrível toma conta das cidades litorâneas, mas como sou do Nordeste, não tenho motivos para reclamar. Das muitas coisas que tenho visto, o que realmente tem me chamado a atenção são os alicerces com que muitas cidades antigas foram fundadas.

Ontem mesmo estávamos na região da Sicília passeando pelos locais que receberam diferentes civilizações importantes (como os bizantinos, os gregos e romanos). Observei, meus amigos, que muitas edificações permaneciam, não inteiramente, mas seus alicerces estavam mantidos.

Eram pedaços de paredes milenares, feitas de pedras escuras que datam de origens incertas, mas se negam a deixar a história morrer e tenho certeza que se precisasse erguer novas edificações, os alicerces seriam aproveitados.

 Construções milenares, alicerces indestrutíveis… É o velho mundo trazendo mensagens para nós, do mundo moderno, de edificações frágeis e substituíveis.

A qualidade do alicerce

Quando a guia de turismo começou a trazer informações extras (aquelas que não interessam ao turista comum) estiquei minhas orelhas para ouvir melhor: Ela dizia que a cidade que visitávamos fora construída numa imensa rocha, com cercas duplas de pedra e as casas em paredes de basalto, telhas sicilianas e janelas emolduradas na própria pedra. Enfim, eram verdadeiras fortificações.

Não sou geógrafa ou historiadora e sim, uma curiosa de nascença e com meu conhecimento básico sobre construção, vê-se que os são materiais utilizados podem durar séculos, como minhas panelas de ferro, que me deram garantia da vida toda.

Brincadeiras à parte, o que quero dizer é que por mais que o tempo passe, e as resilientes famílias que ainda moram “nesse pedaço de fim de mundo que ficou famoso após a filmagem de O Poderoso chefão” se mudem ou abandonem as casinhas, como estão fazendo, o alicerce permanecerá. O motivo, é que ele foi forjado com material de natureza quase indestrutível!

Foi o que aconteceu com o Castelo Pentefour . Tal castelo, que se estima ser do século XVII, passou por diversos governantes incluindo sarracenos, bizantinos, normandos, espanhóis, romanos, mas seus alicerces ainda permanecem.

E nossos alicerces, meus amigos, como estão?

Somos castelos que abrigam tantos “senhores…”

Eu poderia citar alguns deles, como nossos medos, inseguranças, nossas dores, nossos amores, as perdas, as alegrias (sim, tem gente que morre de alegria, pois o coração não aguenta), nossos pensamentos (os piores senhores) que nos causam tantos desconfortos, dentre tantos outros.

São senhores exigentes que nos maltratam demais e sacodem nossos alicerces. Por essa razão, precisamos deles firmes e inabaláveis como os da pequena cidade italiana.

Como estão nossos alicerces para suportar tudo isso?

Ao contrário dos castelos milenares, não somos feitos de pedras. Nossos alicerces são moldados ainda na infância com o cuidado e amor de nossos pais, bem como com a confiança adquirida na convivência familiar, com nossas primeiras quedas e primeiras conquistas.

Ao longo dos anos, tais alicerces são fortalecidos com os desafios da vida, com pessoas que cruzamos pelo caminho, pelas superações e como dizia a poeta “com os toques suaves da alma.”

Entretanto, dentro de nós, existe um material inquebrável e duradouro, a nossa fé. Temos a capacidade de crer que tudo vai acabar bem no final, mesmo que a realidade seja diferente.

Eu sei que, por vezes, parece que está bem difícil de encontrar, mas se procurarmos nos nossos alicerces, ele estará lá, como uma cola juntando tudo o que nos alicerça desde o início. Convém, todavia, que a gente o fortaleça diariamente.

Não fomos feitos para durar por milênios, meus amigos, pois ao contrário das edificações italianas, nosso material é perecível e frágil. A alegoria que fiz aqui é para que sejamos nós, indestrutíveis enquanto estamos por aqui. Que os vendavais, as guerras internas, os tantos “senhores do castelo” venham e partam. Devemos permanecer firmes em nossos alicerces e assim, teremos ainda muita história para contar.

Agora me conte, qual “senhor do castelo” tem sido mais cruel, te abala, mas não te derruba?

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4 comentários em “Alicerces”

  1. Hoje o que rogo a Deus é para conseguir ser o alicerce que meu filho precisa. Que ele possa ter em sua base sólida, com muito amor, união e fé. Tento passar a ele um pouco do que recebi de “mainha”. São muitas as lutas, desde pequenino, mas ele já conhece e sabe que a força dele vem do alto. E isso me enche de gratidão.

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  2. Realmente as ruínas do velho mundo impressionam. Já tive o privilégio de conhecer algumas e sei o quanto são monumentais e imponentes, por mais que tenham sofrido com intempéries diversos. A comparação desses alicerces com os nossos é muito interessante. Todos também passamos por intempéries na vida, podemos desmonorar, ruir, em alguns momentos, mas se as bases são sólidas, conseguimos nos manter de pé. Acredito que esses alicerces são a base familiar e também de tudo que vamos construído ao longo da vida. Já passamos por perdas diversas (entes queridos, empregos, amores…), mas aqui estamos, prontas para contar histórias, não é mesmo? 😉 Adoro suas crônicas, querida!

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