Despedidas

Tem coisa mais difícil que despedidas? Ninguém gosta desses momentos. Nesse domingo, depois de 28 dias no mar (sem contar com o cruzeiro anterior), pausamos em casa. No dia anterior, aos poucos, fomos nos despedindo das pessoas que conviveram conosco durante esse período: as atendentes do Café, o garçom e sua ajudante, uma indiana muito simpática, bem como o sommelier do restaurante Blue.

No dia seguinte, dissemos adeus ao camareiro Ahmed, que visitava nossa cabine duas vezes por dia, aspirando o carpete, recolhendo as toalhas usadas e deixando chocolates nos travesseiros, dentre outras atividades.

Eu não sei se é pelo fato de eu ser mulher, que me apego demais às pessoas (deve ser essa natureza maternal e aqueles hormônios que abalam nossas estruturas). Procuro não demonstrar, mas é inevitável: se alguém me trata com gentileza, já pode dizer que me conquistou. E, consequentemente, é o tratamento que também vai receber de minha parte.

Aqui, na cultura americana, não tem muito essa coisa de abraços e beijos, mas como tenho “sangue latino,” como diz Ney Matogrosso, sou dada à essas demonstrações de afeto. Meu marido vive me advertindo “não faça isso, que o pessoal não gosta”, mas até hoje, nunca passei constrangimento por oferecer gestos de carinho.

Enfim, despedimo-nos. A atendente do restaurante, cujo nome é “Situante” (escrevo em português para melhor compreensão de meus patrícios) muito agradável, disse que iria escrever para uma amiga que trabalha no Beyond (o navio em que estaremos na próxima sexta) para nos receber. São coisas que o dinheiro não compra, mas somente com amizade e respeito mútuo, se conquistam.

As despedidas inesperadas

Bem, narrei-lhes despedidas comuns, mas, infelizmente, nem todas são assim. A vida em si é uma caixa de surpresas e o tempo, seu principal mecanismo. Se olharmos ao nosso redor, vemos as pessoas com as quais convivemos nas diferentes áreas de nossa vida (pessoal, profissional, recreativa). Algumas destas, chegamos a pensar, que estarão conosco por um longo tempo. Todavia, as despedidas chegam e sem avisar.

Na semana passada, o Brasil ficou perplexo com a partida repentina da jovem advogada Brena, de Santo Antônio do Salto da Onça, município do agreste potiguar. Uma moça de 26 anos que estava em pleno exercício da advocacia, quando teve sua vida ceifada de maneira covarde. Ela não teve tempo de se despedir da família, dos amigos, das pessoas de seu convívio.

Como Brena, muitas pessoas passam por isso, num país, tão imponente, mas onde a criminalidade vem tomando uma proporção superior ao que a sociedade pode conter.

As despedidas que não percebemos

Além dessas despedidas bruscas, há aquelas que acontecem e não percebemos: Quando criança, na ocasião em que se encerrava um ano letivo, minha preocupação (e, acredito que a dos demais) era saber se tínhamos “passado de ano”’ ou não. Não parávamos para pensar se iríamos ver tal colega no próximo ano, se algum deles ia mudar para outra escola ou para outra cidade.  E, sem perceber, naquela tenra idade, nos despedíamos de nossas professoras, dos colegas, da tia da merenda e de outros atores envolvidos em nossa vida estudantil.

Da mesma forma, aquela turma das brincadeiras de rua como esconde-esconde, tica, corda, cobra-cega, queimada, cantigas de roda (aos leitores que não conhecem as brincadeiras de rua do Nordeste, fiquem à vontade para perguntar), em que também não recordamos quando foi a última vez que nos reunimos e depois, cada um foi para sua casa com os joelhos ralados e pés sujos de poeira, seguiu a vida, sem despedidas…

Ou, as despedidas de nossas avós. Convivi com as duas e não percebi quando foi a “última vez” que minha avó materna cuidou de nós, ou que minha avó paterna deixou de conversar, alegremente, sobre tudo.

Despedimo-nos também da nossa infância, da nossa adolescência, sem sequer saber quem somos ou para onde estamos indo. Despedimo-nos da casa de nossos pais, de nosso bairro, de nossa cidade e, no meu caso, do país.

Quando vim para os Estados Unidos, lembro que meu pai me deu um grande abraço e ele não era dessas coisas. Mamãe, conversava muito, fazendo aquelas recomendações. Despedi-me feliz, pois sabia que em breve retornaria ao Brasil para visitá-los. Foi a última vez que o vi e agradeço a Deus por viver aquele momento.

Particularmente, gostaria que todas as despedidas fossem assim, sem planejar, acho que a gente sofreria menos.

Quando as despedidas são internas

Sim, também nos despedimos de nós mesmos, quando deixamos o “velho” eu para trás e através de novos hábitos, pensamentos, surge um “novo.” Faz parte de nossa evolução como seres humanos.

É sempre válido despedir-se das fraquezas, das falhas, dos defeitos que comprometem nosso crescimento… Tais despedidas são bem-vindas, bem como aquelas de pessoas desagradáveis, como colegas de trabalho complicados ou parentes tóxicos. Para estes, a gente cita a célebre frase musical do cantor Roberto de Souza Rocha, vulgo Latino: “vá, vá em paz e não volte jamais.”

As despedidas sentimentais

Não falo daquelas despedidas cinematográficas que assistimos nos filmes, onde um casal se acaba de chorar, mas é sempre angustiante despedir-se de um relacionamento amoroso que não deu certo, mesmo que ainda existam sentimentos inflamados.

Outra despedida dolorosa é quando damos adeus aos nossos animais de estimação, os quais aprendemos a amar como alguém da família. Lágrimas são inevitáveis.

Ah, não poderia esquecer da despedida dos bons colegas de trabalho, que por diversos motivos, precisam partir. Às vezes passamos mais tempo com eles que, propriamente, com nossa família. Nesses casos, a amizade floresce e vence a barreira do tempo.

A verdade, meus amigos, é que a vida, com sua engenharia, vai nos tangendo para lá e para cá e, sem perceber, vamos nos despedindo de tudo, aos poucos.

A última despedida

A última despedida, que sempre vai deixar cicatrizes em nossos corações, é a despedida que mais evitamos, mas não podemos fugir dela, ou seja, a morte.

Sempre pensamos em longevidade sem nos preocuparmos com nossa finitude. No fundo, somos conscientes que a vida é mesmo breve e cada dia é uma despedida, de forma invisível, mas real. Portanto, temos a obrigação de vivê-la bem, em paz conosco, com os que amamos e com a sociedade em que fazemos parte.

Agora me conte, qual foi a sua despedida mais marcante ou uma despedida que, se você pudesse, teria feito de forma diferente.

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8 comentários em “Despedidas”

  1. Bom dia. Tive varias, na minha vida, umas despedia, sem saber que seria a ultima vez que via. Meu esposo, saiu pra trabalhar, e sofreu um acidente e não voltou mais. Mãe, quando saiu de casa, que eu a olhei, e nos seus olhos, vi que ela estava se despedindo. Essas , foram as piores.

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  2. A nossa vida, de fato, é cheia das mais diversas despedidas. Lembro qdo fui morar em outra cidade, dei um abraço sem fim em mainha, ô despedida para me doer. Eu sabia a saudade que ela sentiria. E qdo retornei, no início da Pandemia, precisei esperar ainda mais um pouco para dar-lhe o abraço que eu tanto queria.

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  3. Lembro que nas festas de concluírem, em algum momento se cantava aquela música “Já está chegando a hora de ir;
    Vim aqui me despedir e dizer
    Que em qualquer lugar por onde eu andar
    Vou lembrar de você.
    Só me resta agora dizer adeus
    E depois o meu caminho seguir
    O meu coração aqui vou deixar, não ligue se acaso eu chorar, mas agora, adeus.”

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  4. Só me resta continuar lendo os comentários dos seus leitores.foi muito lindo quando você escreveu”cada dia é uma despedida de forma invisível “ eu complemento devemos viver intensamente o presente, feliz por estar vivendo esse momento.

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