Tempo bom

Reflexão sobre aproveitar a vida

Nesta sexta-feira estamos republicando mais um artigo da nossa ex-colaboradora Deborah Braga publicado na coluna de ponta-cabeça em 06/05/2019, intitulada à procura que traz uma reflexão sobre as perspectivas e o saber aproveitar a vida. Leia, reflita e tire as suas próprias conclusões.

Conhecer meu pai é como ler Poliana para adultos. Meu pai é uma das pessoas mais otimistas que conheço. Não existe tempo ruim. E olhe que ele já esteve em muitas guerras e já perdeu bastantes batalhas contra si mesmo. Apesar das derrotas, nunca caiu do cavalo. Eu sempre tinha dúvidas se realmente havia ocorrido uma guerra. A dúvida era sanada quando eu olhava para a minha mãe.

Dizem que viver, hoje em dia, não é coisa fácil. Se você está lendo e apreciando este artigo, parabéns. Normalmente, não temos tempo ou afirmamos não termos tempo para viver fora do nosso escopo de trabalho. Isso foi uma das coisas que não aprendi com o meu pai.

Claro que eu o vi trabalhando em casa, às vezes, até exaustivamente lutando contra o sono. Mas ele estava lá. E nunca negou atenção quando eu precisava tirar dúvidas sobre as tarefas da escola. Aliás, meu pai nunca negou nada. Nunca negou uma presença ou uma discussão filosófica alegando estar cansado ou ocupado, nunca negou presentear alguém mesmo estando duro. Inclusive, não é uma palavra com a qual ele não é muito familiarizado.

Sempre soube tirar proveito, literalmente falando, das situações indesejadas, como apreciar o toque musical de espera do serviço de atendimento telefônico ou apreciar uma viagem de ônibus de 21 horas, aproveitando para atualizar seu blog e admirar a paisagem; das desejadas, nem se fala.

Nunca vi meu pai de cara fechada. Se vi, ela deve ter durado cerca de três segundos. Nunca vi meu pai reclamando de dor. Reclamar, por si só, já vi. Algumas vezes. Mas em todas elas, o tom era de desabafo, nunca remoendo ou com o intuito de difamar alguém.

Para o meu pai, viver é uma grande montanha-russa, em cuja fila ele entraria várias vezes. Porque cada vez que você vai, você tem uma perspectiva diferente.

A primeira vez, você vai e vomita. A segunda vez, você vai com os olhos fechados com medo de vomitar de novo, mas vai. A terceira vez, você vai e já consegue abrir os olhos. A quarta, já consegue gritar. A quinta, você vai e consegue admirar a paisagem. A sexta, você já consegue até identificar, lá de cima, os conhecidos que estão te esperando entediados e alguns desconhecidos assustados, que não têm coragem de entrar na fila, lá embaixo.

Dentre os que saem do brinquedo, existem aqueles cansados, exaustos, que só querem ir para casa e os que enfrentam a fila da foto, compram a foto e procuram pela próxima atração. E adivinha em qual desses grupos o meu pai está..?

De fato, viver o tempo bom não é para muitos. Mas aprendi com o meu pai que viver as oportunidades que a vida oferece é disciplina obrigatória, jamais optativa.

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