Arquivos religião - Blog do Saber https://blogdosaber.com.br/tag/religiao/ Cultura e Conhecimento Tue, 12 Mar 2024 01:03:57 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=6.4.3 A mulher frente ao Estado e à ciência https://blogdosaber.com.br/2024/03/12/a-mulher-frente-ao-estado-e-a-ciencia/ https://blogdosaber.com.br/2024/03/12/a-mulher-frente-ao-estado-e-a-ciencia/#respond Tue, 12 Mar 2024 09:30:00 +0000 https://blogdosaber.com.br/?p=4367 Ler mais]]> Dia Internacional da Mulher

Passado o dia internacional da mulher, suas homenagens e menções honrosas, encontramo-nos ainda no mês dela. Ocasião que o comércio aproveita para estender e, nós, mulheres, aproveitamos para usufruir. Passadas as ofertas e comemorações, ficando em segundo plano a luta histórica em que quase 130 operárias reivindicavam igualdade salarial e acabaram morrendo carbonizadas, restam-nos, então, as estatísticas.  

Violência doméstica, assédio moral e sexual em ambiente de trabalho, feminicídio, aborto e planejamento familiar. Esses são tópicos que normalmente pertencem ao “campo de batalha” da mulher, quando deveria ser de interesse de todos os envolvidos. Afinal, todos são filhos, além de avós, pais, tios, irmãos, colegas.

Direito ao aborto

Na semana passada, “A França se tornou o primeiro país do mundo a incluir o direito da mulher ao aborto na Constituição”. Veja citação de artigo da BBC

O aborto é legal na França desde 1975, mas o presidente Macron comprometeu-se a consagrá-lo na Constituição após a Suprema Corte dos Estados Unidos ter revertido a decisão Roe contra Wade, em 2022.

O caso Roe contra Wade se deu em 1973 na Suprema Corte dos Estados Unidos, onde uma mulher grávida, Jane Roe (pseudônimo de Norma McCorvey), entrou com uma ação em busca do aborto de seu terceiro filho, alegando ter sido estuprada. O promotor público que recebia o caso era Henry Wade, defensor da lei antiaborto. 

Apesar do processo de Jane Roe ter sido deferido, com o tempo, ativistas antiaborto acabaram obtendo algumas conquistas, como:

  • lei proibindo “o uso de fundos federais para o aborto, exceto quando necessário para salvar a vida de uma mulher” em 1980;
  • restrições proibindo “abortos em clínicas estaduais ou por funcionários públicos” em 1989;

Entre outras… Até que em 2022, “A Suprema Corte decidiu a favor da proibição do aborto no Mississippi após 15 semanas de gestação”, abrindo precedentes para novas restrições e proibições. Veja mais em Roe x Wade: o que muda com decisão da Suprema Corte dos EUA sobre aborto? 

Os números falam por si

Bom, os números apontam que 85% dos franceses são a favor da emenda constitucional. Portanto, neste caso, podemos dizer que a população em geral entende que o aborto é uma opção necessária. Nos Estados Unidos da América, uma pesquisa de opinião mostrou que 58% dos norte-americanos acreditam que o aborto deve ser legal em todos ou na maioria dos casos. Saiba mais em artigo do Poder 360. Já, no Brasil, a pesquisa divulgada no ano passado apontou que apenas 39% dos cidadãos são a favor nesse tema. 

É claro que entre Brasil, Estados Unidos e França existem diferenças culturais significativas. A começar pela influência direta do tempo de existência desses Estados e da solidificação de suas leis e constituições, o que define, inclusive, um acesso maior ou menor à educação. 

Países em que o acesso à educação e à independência financeira da mulher é maior tendem a contabilizar menos casos de gravidez forçada ou indesejada. E isso significa dizer que os custos do Estado com procedimentos abortivos devem ser menores em comparação a países mais novos. Afinal, argumentos sobre verbas municipais, estaduais e federais sempre entram em pauta, especialmente quando tratamos de Estados laicos.

Estado laico

O Brasil, apesar de laico, possui uma representatividade cristã extremamente alta. Uma pesquisa de 2023 divulgada pela BBC News mostrou que “quase nove a cada dez brasileiros dizem, por exemplo, acreditar em Deus”.

O índice de 89% de crença em um poder superior coloca o Brasil no topo do ranking de 26 países elaborado pelo Ipsos, com base em uma plataforma online de monitoramento que coleta informações sobre o comportamento destas populações.

Dos 89%, 70% afirmaram ser cristãos, católicos e evangélicos em sua maior parte. Isso significa dizer que, apesar de laico, a partir do momento em que as leis são feitas por seres humanos, que experimentam as suas vidas baseadas em crenças, o seu entendimento do que é melhor para a sociedade necessariamente será pautado nessas experiências. Especialmente em se tratando de países cujas constituições ainda não sofreram um processo de amadurecimento tão longo.

Casos em evidência como o do hospital particular São Camilo, em São Paulo, que se recusou a implantar um DIU (dispositivo intrauterino) em uma paciente enviada pelo SUS, acontecem e seguirão surgindo. Apesar do hospital ter convênio com o SUS, ele informou que “não faz procedimentos contraceptivos — em mulheres ou homens”, apenas em casos graves de saúde, como endometriose. Nesse caso, afirma ter orientado “a paciente a buscar outro prestador de serviço dentro da rede credenciada do plano de saúde”. Veja mais em artigo do Conjur.

Mais tarde, o Consultor Jurídico publicou o texto Juiz evoca liberdade de crença para rejeitar ação contra hospital que negou DIU, onde o entendimento do caso pelo juiz é: 

O ato de negar o implante de um dispositivo intrauterino (DIU), usado como método contraceptivo, é válido quando o estatuto social do hospital deixa claro que se trata de uma associação civil, de caráter confessional católico.

No entanto, após a decisão, o presidente da Comissão Especial de Bioética da OAB-SP, Henderson Fürst, faz a seguinte crítica:

O planejamento familiar é um direito fundamental expressamente estabelecido pela Constituição, pela Lei do Planejamento Familiar, pela Lei 8.080/1990, e também pela Lei 9.656/1998, ou seja, é um direito tanto no sistema público quanto no sistema suplementar de saúde. Um hospital pode se recusar a realizar o procedimento somente se não estiver na rede de procedimentos contratados com a operadora de saúde. Se estiver contratado, ou se o atendimento é no âmbito do SUS, não há objeção de consciência institucional assegurada por lei — mas há, sim, direito ao planejamento familiar determinado por lei.
A faculdade de julgar: o Estado frente à ciência

Fica mais claro, então, o que significa uma constituição pouco madura e, ao mesmo tempo, a ideia de uma nação dividida entre o antiaborto e o pró-aborto. 

A ideia aqui não é julgar o aborto ou os métodos contraceptivos, mas tentar entender o por quê da posição do nosso Estado em diferentes mandatos, bem como por que a nossa constituição possui tantas brechas. 

Quando se fala de legislação, normalmente, existe um apoio na ciência, certo? Mas, então, por que certas questões como “Quando uma célula se torna uma pessoa?” apresentam posições tão contraditórias? Pois o que era, até então, comum no Alabama, tornou-se uma prática proibida nas clínicas de fertilidade. Três casais norte-americanos conseguiram reverter a legislação estadual, determinando que todos os embriões passassem a ser considerados crianças, depois que tiveram destruídos acidentalmente os seus materiais fecundados. A prática segue operante no restante do país. Leia também Quando uma célula se torna pessoa? O consenso científico sobre a polêmica dos embriões.  

Assim, retornamos à questão da leitura da ciência a partir de um determinado ponto de vista, colocada no último artigo desta coluna, Crítica do saber prático: psicanálise é filosofia:  

Em outras palavras, Hegel diz que os saberes em relação às coisas da vida são construídos a partir da experiência do sujeito, que, por sua vez, encontra-se no mundo físico. Então, apesar da experiência se encontrar na história da mecânica newtoniana, juntamente à ciência, o saber que se produz dela depende da interpretação ou da ligação do sujeito com o mundo, que, então, enquadra-se no movimento da dialética, dentro do campo da metafísica.

O Estado é laico, tendo como premissa a não admissão da influência religiosa na conduta governamental, no entanto, é liderado por pessoas de fé. E, como parte ainda da premissa, deve “respeitar, proteger e tratar de forma igual todas as religiões, fés e compreensões filosóficas da vida”, embora seja governado por seres que nem tudo sabem e nem tudo toleram.

O Estado é laico, mas as pessoas não o são. 

]]>
https://blogdosaber.com.br/2024/03/12/a-mulher-frente-ao-estado-e-a-ciencia/feed/ 0
O perverso e a Alegoria da Caverna de Platão: por que tantas pessoas se submetem a atos religiosos macabros? https://blogdosaber.com.br/2023/05/09/o-perverso-e-a-alegoria-da-caverna-de-platao-por-que-tantas-pessoas-se-submetem-a-atos-religiosos-macabros/ https://blogdosaber.com.br/2023/05/09/o-perverso-e-a-alegoria-da-caverna-de-platao-por-que-tantas-pessoas-se-submetem-a-atos-religiosos-macabros/#respond Tue, 09 May 2023 09:30:00 +0000 https://blogdosaber.com.br/?p=1475 Ler mais]]> No Quênia, seguem as investigações a respeito da quase uma centena de corpos encontrados e de outras dezenas de pessoas resgatadas, membros da Good News International Church. O líder da igreja teria induzido os fiéis a passarem fome para que pudessem “encontrar Jesus”.

Essa é apenas mais uma de tantas outras histórias conhecidas de atos macabros praticados pela própria humanidade dentro de cultos religiosos. Podemos citar aqui: o Templo do Povo – Jonestown, o Ramo Davidiano, Heaven’s Gate, a Igreja dos Mórmons que não abandonou a poligamia de Warren Jeffs, entre outros.

O que se espera de uma religião?

Conforto? Motivos para continuarmos seguindo a nossa caminhada? Seja na busca de amigos, respostas ou de sensação de paz ou de utilidade, a religião, não importa qual seja a linha, tem um papel muito importante na civilização. Ela controla o que hoje chamamos de barbárie e traz esperança para a espécie humana.

Independente do motivo, muitos líderes religiosos creem piamente naquilo que pregam, outros nem tanto. Normalmente, estes últimos, mesmo se dizendo profetas, não se colocam na lista de sacrifícios. Eles se satisfazem com o poder que têm sobre os outros.

O que querem os perversos?

Querem satisfazer os seus desejos. Assim, como qualquer outro indivíduo, o perverso é movido por instintos. Raiva e inveja são os principais sentimentos. Mas, nesse caso, não existe o recalque, aquele fornecido pelas religiões e que barram o sujeito da passagem ao ato. O perverso passa por cima da lei bem como do desejo dos outros.

Por que caímos na lábia do perverso?

Todos nós temos experiências completamente diferentes. Nascemos diferentes, nos lugares mais diversos e com mais ou menos oportunidades. Dizem que até um ateu chama pelo “meu deus” em momento de desespero! Pois é, todos sabemos que, em algum momento, a procura por uma religião também pode ser uma forma de pedir socorro. Já que não dou conta sozinho, alguma outra coisa pode me ajudar.

Quando estamos angustiados, dificilmente conseguimos parar para raciocinar. Queremos um resultado imediato: uma palavra que conforte, uma saída para o nosso sofrimento. Tornamo-nos frágeis, vulneráveis às perversões. Aqui, tudo parece impossível, embora, ao mesmo tempo, tudo o que aparece seja possível.

Escultura do rosto de Platão
E o que Platão tem a ver com isso?

Por outro lado, há também aqueles que só conhecem uma única realidade, uma única verdade. Aqueles que nunca saíram da caverna, como na Alegoria da Caverna, de Platão. Para quem não conhece, o mito conta a história de um grupo de pessoas que viviam acorrentadas em uma grande caverna. As suas sombras projetadas na parede a partir da luz da fogueira eram a única paisagem que elas podiam enxergar.

Um dia, uma dessas pessoas consegue se libertar das correntes e sai da caverna. Em contato com a luz do sol e todas as cores refletidas pela natureza, o ex-prisioneiro se sente assustado e pensa em retornar à caverna. Mas ele logo percebe a preciosidade de suas descobertas e resolve voltar apenas para contar aos demais sobre a novidade. Os outros não acreditam nas histórias que conta o ex-prisioneiro, chamam-no de louco e o matam a fim de evitar que suas ideias os atraiam para os “perigos da insanidade”.

Quanto ao templo de Warren Jeffs, por exemplo, a grande maioria das mulheres que vivia na pequena comunidade não tinha vivência fora daquele ambiente nem acesso aos estudos. Eram disciplinadas a rezar, obedecer aos seus maridos, conviver com suas outras esposas e reproduzir.

Da mesma forma, podemos pensar na religião mulçumana, quando as mulheres têm o seu órgão genital mutilado ainda enquanto crianças. Ou quando as suas penas, em relação ao homem, são muito mais severas em caso de adultério ou seus direitos são ínfimos frente aos deveres. Apesar da dor, como se trata de algo cultural, naturalmente, não se pensa em outras possibilidades. O proibido é proibido e ponto final. Questionar “por que não posso mostrar o meu cabelo?” seria, na cultura ocidental, como perguntar “por que não posso roubar?”.

Bom, por um ou por outro motivo, a submissão tem sempre um porquê que nem sempre é acompanhado de argumentos racionais, mas são o suficiente para fazer sentido a algumas pessoas em determinados estados de espírito ou de determinada formação.

]]>
https://blogdosaber.com.br/2023/05/09/o-perverso-e-a-alegoria-da-caverna-de-platao-por-que-tantas-pessoas-se-submetem-a-atos-religiosos-macabros/feed/ 0