Ana Madalena, Autor em Blog do Saber http://blogdosaber.com.br/author/ana-madalena/ Cultura e Conhecimento Tue, 09 May 2023 18:46:54 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=6.4.3 Amor que fica… https://blogdosaber.com.br/2023/05/10/amor-que-fica/ https://blogdosaber.com.br/2023/05/10/amor-que-fica/#respond Wed, 10 May 2023 09:30:00 +0000 https://blogdosaber.com.br/?p=1473 Ler mais]]> É amor de…

A nossa coluna Crônicas desta quarta-feira está demais, com a incrível Ana Madalena que narra uma estória mirabolante dos tempos de adolescência dela e de sua turma de colégio de arrepiar: amor que fica é amor de…O resto você já deve imaginar, não? Então se divirta com essa maravilhosa peça de ficção dos idos dos anos 1970, 1980 e 2025.

Baseada em fatos reais, alguns que ainda vão acontecer!

Novembro de 2025

Dizem que há três modos de vermos a vida: através da realidade, da imaginação ou através de outra pessoa. Hoje eu vou ser essa outra pessoa. E a história que vou contar aconteceu há muitos anos, quando Madu era uma mocinha. Você pode até indagar o porquê dessa digressão, uma vez que faz tanto tempo, que até já entrou para o esquecimento… Será? Então, como explicar o que aconteceu na última reunião de amigos dos tempos de colégio?

A festa

Era quase meia noite. A banda tocava animada os hits das décadas de 70 e 80. Todos dançavam alegremente! Desde a pandemia a turma do pré 80 ainda não se encontrara. Estavam eufóricos, a não ser por um colega que olhava tudo de modo distante; ele era daqueles que nunca participara das festinhas, nem tão pouco do grupo do whats, talvez por ter sido extremamente tímido e etiquetado como esquisito. Deve ter sofrido muito bullying, coitado, mas ali, diria que parecia estar em paz com seu passado. Ele estava acompanhado por uma mulher claramente mais velha do que ele, mas bastante animada e parecendo feliz. Madu assistia a tudo com um sorriso de Monalisa, daqueles indecifráveis, mas eram seus olhos aguados que denunciavam a emoção reprimida. Ah… Os olhos de Madu… Olhos para todos os gostos!

O reencontro com a galera

A banda fez um intervalo rápido e Madu aproveitou a ocasião para retocar a maquiagem. Em vez de seguir para a esquerda, caminho mais rápido para o toilet feminino, ela contornou o salão e passou em frente ao masculino, onde havia uma pequena fila de espera. E como quem faz uma revista à tropa, passou por cada um daqueles rapazes, agora sessentões e perguntou:

  • Como vão os meus meninos?

Ela não esperou as expressões de espanto, nem os comentários. Seguiu de volta para o salão onde, com sorriso de orelha a orelha, dançou com seu marido sua música preferida, “Outra vez”, de Roberto Carlos. Madu girava o corpo de uma forma sensual, enquanto cantava os versos da música quase como uma devoção. Que coisa linda de se ver! O jogo de luzes coloridas de repente ficou apenas com a luz branca, iluminando todos. Foi perceptível a reação dos homens ali presentes. Eu, que sou expert em leitura labial, entendi quando um grupinho masculino comentou entre si:

  • Não é possível! Vocês estão pensando o mesmo que eu?
  • O sorriso está bem diferente…
  • Quem é aquele homem que está com ela? Estudou com a gente? Era do nosso pré?
  • Vocês viram o jeito de dançar? Lembram quem fazia aquele movimento?

Janeiro de 1977

O verão estava escaldante! Ninguém aguentava ficar muito tempo dentro de casa e por isso as atividades ao ar livre eram as preferidas de todos. Por sorte, no Natal, a maioria ganhou bicicletas! Era um tempo feliz, sem violência, quando podíamos pedalar pelos bairros sem preocupações. Os mais velhos, de quinze para dezesseis anos, comandavam todo o itinerário; os menores obedeciam sem questionamentos, a não ser no dia que disseram não querer mais meninas nas pedaladas.

Como assim? Eu fazia parte do grupo, pedalava junto com meu irmão e fiquei muito chateada! Mas, sabida como sou, desvendei o mistério! Sim, e por um detalhe… Aliás os detalhes são as peças chaves mais importantes numa história.

Não viram Shakira? Descobriu a traição do então marido por causa de um pote de geleia! Pois bem, o meu pote de geleia foi perceber o cuidado exagerado dos meninos com o banho, coisa que faziam praticamente obrigados. Dias depois, eu ouvi um zum zum zum… Até então eu imaginava que tamanho asseio fosse por causa de alguma paquera ou porque resolveram se juntar a uma turma de ciclistas só de meninas.

A “zona de perigo”

Sim, era comum o clube dos Bolinhas e das Luluzinhas, algo altamente sexista, mas perdoável naquele tempo. Mas aí ouvi meu irmão falando ao telefone com um amigo a respeito de uma construção, num local que eles chamavam de “zona de perigo”, que por óbvio não tinha nada a ver com o hit de Leo Santana. Achei tudo esquisitíssimo e fiquei antenada para estar lá no dia e hora combinados mas, ansiosa, fui antes conferir.

Era uma obra grande, que segundo soube, seria a construção de um Centro Espírita. Não entendi o porquê dos meninos se encontrarem ali, um local cheio de tijolos e metralhas, que poderiam até furar o pneu das bicicletas. Voltei para casa com a pulga atrás da orelha e aguardei o sábado, final da tarde. Inventei uma desculpa para sair e cheguei na obra muito antes deles, mas não havia ninguém. Até que ouvi uma voz grossa, de homem, que parecia brabo:

  • Madu, vai se arrumar. Os meninos já estão chegando!
  • Mas papai, hoje eu queria …
  • Você não tem querer, retrucou o pai, dando por encerrado o assunto.

O rapaz do Fiat 147

De relance pude ver a silhueta de Madu; era uma mocinha muito franzina de cabelos escuros. Ela passou bem perto de onde eu estava e pareceu-me chateada. Vestia um short curtíssimo e um top, o que a tornava ainda mais magra. Um Fiat 147 chegou ao local, o que a fez correr em direção a um quadrado de madeira no fundo da obra, que pelo que entendi, era a casinha do vigia, seu pai.

O rapaz do Fiat era amigo do meu irmão; ele tinha apenas dezesseis anos, mas já ganhara um carro dos pais. Madu saiu da edicula de banho tomado, com um vestidinho florido, meio transparente e entrou no carro. O pai dela recebeu algo do rapaz, mas eu, inocente de tudo, não consegui entender aquela dinâmica… Enquanto estava perdida, ligando os pontos, alguns meninos chegaram com suas bicicletas. Vi que jogaram um dado no chão e decidiram quem seria o primeiro… Mas primeiro o quê?

A descoberta

O Fiat retornou algum tempo depois e Madu saiu do carro com a boca ” franzida”, uma caracteristica marcante no rosto dela. Os garotos, uns três, fizeram uma especie de fila e depois, um a um, entrou naquele barraco, saindo alguns minutos depois com uma espécie de sorriso, desses de satisfação, que eu só via quando eles comiam um cachorro quente com refrigerante. O menino que tinha sido o primeiro da fila, deixou sua bicicleta na obra e voltou na garupa de um deles. Estranho, pensei… Assim que todos foram embora, vi quando Madu saiu alegremente para dar umas pedaladas na bicicleta que ficara por lá. Ela passou bem próximo a mim, sem sequer desconfiar que eu estava dando uma de detetive. E foi quando eu vi o porquê da boca franzida: Madu era totalmente banguela!

O boi de Madu

Voltei para casa intrigadíssima. Nos dias seguintes apurei mais ainda os meus ouvidos, mas não ouvi uma conversa sequer sobre Madu. Todas as vezes que os meninos saíam pedalando, eu seguia direto para a obra, mas eles não estavam lá. Passei uma semana nessa lenga-lenga e nada… Até que:

  • Acho que hoje dá certo. Já faz mais de uma semana…
  • E se ela ainda estiver ” de boi”?
  • Pois é… Dizem que mulher “de boi” não pode andar de bicicleta, senão fura os pneus!
  • Nos livros está escrito que dura de cinco a oito dias…
  • Melhor esperar mais um pouco para a gente não correr risco!

Eu não sabia o que era o tal ” boi” que os meninos falavam, mas devia ser algo muito violento, ao ponto de furar os pneus da bicicleta. Tive receio de perguntar e levantar suspeitas, mas intrigada mesmo eu fiquei quando ouvi eles falando em “sexo oral”. Eu, que era a ingenuidade em pessoa, achei que sexo oral fosse falar palavrão e não entendi o porquê de elogiar o “oral” de Madu. Talvez fosse porque ela só falava palavras bobinhas, tipo “merda”, muito embora nem isso eu pudesse dizer, senão levava uma chinelada dos meus pais. Sim, naquela época a meninada apanhava com o que estivesse à mão: cinto, chinelo, tamanco e até espanador!

O caso com o Galeguinho

A construção do Centro Espírita foi concluída meses depois, o que provocou uma tristeza geral nos meninos, embora rapidamente já estivessem sendo consolados pelas namoradinhas. A diversão deles deixou de ser a pedalada para idas ao cinema, época que muitos falsificavam as carteiras para assistir filmes para maiores de dezoito anos. E foi num sábado à noite, quando foram ao Cine Rio Grande, que viram Madu aos beijos com um menino da turma. Era um galeguinho, cujos avós moravam perto do Centro Espirita. Souberam que ele era assíduo frequentador do local e, daquele dia em diante, a turma começou a “tirar onda” com o colega, pois sabiam que ele estava “caidinho” por Madu.

Janeiro de 1981

A cidade estava praticamente deserta enquanto as praias de veraneio super lotadas. A maioria da turma de 1980 passou no vestibular e foi aquela festança! Os novos universitários que ostentavam com orgulho suas carecas, acertaram previamente as datas das comemorações, pois desse modo os amigos poderiam participar de todas as festas. O galeguinho, aquele do cinema, entrou para o curso de Medicina, fato que o fez desligar- se de Madu, mas não por desejo próprio, mas por contingência da vida. Ele tinha aula o dia todo e com tamanha carga horária, não tinha tempo nem para se coçar! Especializou-se em ginecologia e obstetrícia e logo depois passou no concurso para trabalhar no Hospital da Polícia Militar, tornando-se um dos médicos mais conceituados da cidade.

E foi lá, naquele hospital, quando estava em um plantão, que atendeu uma parturiente, que lhe pareceu familiar. Nervoso, fez a anamnese, mas arranjou uma desculpa qualquer, e repassou a paciente para uma colega. Ele já estava noutra fase da vida e não queria reviver um sentimento que marcara sua adolescência. Madu também não teceu comentário algum. Apesar de saber que o amor que fica…

A guinada de Madu

Ela tinha encontrado um homem de bom coração, que lhe tirara “da vida”. Ele era um ex-seminarista, da mesma turma dos “meninos”, que em princípio pretendia seguir com a orientação religiosa, mas sucumbiu diante da situação de Madu. De cara ele viu que ela era uma pessoa boa, mas muito sofrida pelos anos que passou sendo explorada pelo pai. E, empenhado em dar-lhe um futuro melhor, arranjou-lhe um emprego de carteira assinada na casa do tio, lugar onde morava. E assim, com a proximidade, ele acabou se apaixonando e desistindo do “projeto batina”. Na verdade, esse projeto era da sua mãe, que tinha o sonho de ter um filho padre.

O casamento de Madu

O ex-seminarista prestou vestibular para Odontologia. A comemoração foi íntima; nem ele convidou os colegas da turma, nem muito menos fora convidado para nenhuma das festas. Ele não se incomodou com isso, pois nunca fizera parte de grupinhos. Passou despercebido todo o segundo grau, era um ser praticamente invisível. A mudança de comportamento veio na faculdade, quando feliz por suas novas decisões, destacou-se na turma, tornando-se um dos melhores alunos, fato que fez com que conseguisse facilmente estágios nos consultórios dos seus professores. Especializou-se em próteses e implantes dentários, sendo seu mais primoroso trabalho realizado na boca de sua amada, que não cabia em si com tamanha felicidade. Ele aproveitou o entusiasmo de Madu e fez o pedido de casamento:

  • Madu, eu cheguei tarde para ser seu primeiro amor, mas deixe-me ser o último!

E Madu disse sim!

Voltando para novembro de 2025

A festa terminou para Madu antes da hora prevista. Os olhares dos “meninos” incomodaram bastante seu marido, embora ele soubesse o risco que corria quando decidiu ir. No fundo ele sempre soube que, para Madu, ele não passava do capitulo de um livro, enquanto para ele, ela era o próprio livro. A verdade que ele não queria enxergar era que Madu nunca esquecera o “galeguinho” mas, mesmo assim, fez questão de caprichar na harmonização facial da amada. Ele queria que todos os colegas ficassem com inveja, que vissem que ele se dera bem! Pobre coitado… Não aguentou a pressão! Descobriu da pior forma que o amor que fica… É amor de… ( completem a frase!)

Ana Madalena

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Descobertas de Nina a auxiliar de cozinha https://blogdosaber.com.br/2023/03/22/descobertas-de-nina-a-auxiliar-de-cozinha/ https://blogdosaber.com.br/2023/03/22/descobertas-de-nina-a-auxiliar-de-cozinha/#respond Wed, 22 Mar 2023 09:00:00 +0000 https://blogdosaber.com.br/?p=1071 Ler mais]]> Hoje trago mais um maravilhoso texto, aqui na coluna crônicas, da grande escritora das horas vagas, Ana Madalena, nossa colaboradora e fundadora desta coluna. Com muita simplicidade e naturalidade ela comenta e disserta sobre o seu novo cotidiano em casa de praia alugada, em praia não divulgada para não atrair os fãs. Com Nina a auxiliar de cozinha, uma nativa da região. O seu novo conto se chama descobertas de Nina a auxiliar de cozinha e ao longo da leitura você vai descobrir o porquê. Vale a pena ler fechar os olhos e se imaginar no lugar dela de tão bem contada que essa história!

Música inspiradora

É como um sol de verão queimando no peito,

Bate um novo desejo em meu coração…”

 Canção de verão, Roupa nova

O verão a todo vapor

O veraneio começou e vai ser daqueles, com direito a muito protetor solar e creme hidratante.

Está muito quente, em todos os sentidos; praias lotadas e festinhas por toda parte.

Ainda bem que estou bem longe de todo esse burburinho; na virada do ano mudei meu local de home office e agora estou numa casa à beira mar, um lugar praticamente deserto.

Os primeiros dias foram confusos; a rotina rígida que tive há tantos anos foi para o espaço.

O barulho das ondas do mar e o balanço das folhas dos coqueiros embalaram meu sono até mais tarde.

A minha sorte é que, com o aluguel da casa, veio uma ajudante de cozinha.

Acordo com o café pronto, um verdadeiro banquete de frutas coloridas e outras coisinhas.

Na minha “vida passada”, só tinha tempo para uma xícara de café e crackers. Estou no lucro.

A internet por aqui “dá para o gasto”, disse o proprietário.

Por sorte, consigo fazer meu trabalho; as reuniões online faço propositalmente com o cenário da praia, enchendo uns poucos de admiração e matando uns muitos de inveja.

Essas reuniões são praticamente minha única conexão com o mundo exterior.

Ainda não fui ao vilarejo fazer compras; por aqui vem sempre um vendedor de frutas, cujo peso/medida é feito com garrafas pet, uma evolução das antigas latas de óleo, segundo ele.

Compro meia garrafa de todas as frutas! Em dias intercalados ele também traz um peixinho, vindo diretamente da rede do arrasto. Um luxo!

A auxiliar de cozinha: Sibito baleado

A mocinha que trabalha aqui é bem franzina, um “sibito baleado”, como ela disse que era chamada, apesar de ter um nome lindo, uma homenagem à bisavó.

Não sei se Nina é “magra de ruim”, mas por via das dúvidas, desde que cheguei, fazemos as refeições juntas, que por sinal são as melhores que já provei.

No começo ela ficou envergonhada, mas agora até repete o prato.

Ela é muito calada, um ” bichinho do mato”, mas eu sempre puxo assunto e logo no primeiro dia descobri que ela tinha problemas para lavar louça.

-Eu não gosto, mas lavo, viu? É porque tenho trauma de infância; levei muita surra quando criança; minha mãe dizia que os copos ficavam com “cheiro”.

Fui solidária com seu trauma, afinal quem não os tem?  Se listasse os meus …

Decidi que lavaria a louça e ela enxugaria; seria uma oportunidade para eu ficar um pouco em pé, uma vez que trabalho sentada o dia todo.

Ela estranhou minha atitude e também meu método.

– A senhora usa essas esponjas todas de uma vez?

– Expliquei que tinha uma para panelas, outra para pratos e talheres e uma para copos.

– Ela perguntou como eu sabia qual era para cada uma, se todas eram iguais?

– Mostrei a letra que escrevi para identificá-las.

– Ela conferiu e murmurou “uhum”. Depois disse-lhe o que lavar primeiro.

– Ela olhou espantada: E tem isso, é?

A descoberta

– Expliquei que meu escorredor era “de primeiro andar”, e por isso eu lavava primeiro os pratos, que logo secavam, e depois os copos, pois assim a água não empoçava sobre eles.

– Ela me olhou como se tivesse feito uma grande descoberta. Espantada mesmo ficou quando viu o armário de roupas, dobradas milimetricamente iguais e cabides com mesmo espaçamento.

– Sim, tenho “toc” e tentei explicar a Nina, mas ela não entendeu.

Nina apareceu toda sorridente na manhã seguinte.

Disse que falou para a mãe “das minhas formas” de cuidar da casa e disse que vai treinar para fazer igual.

Depois, meio sem jeito, perguntou como eu aprendi a ler.

Essa pergunta me pegou de surpresa e questionei se já tinha estudado.

Respondeu com o mesmo monossílabo “uhum”, mas completou dizendo que a escolinha do vilarejo tinha fechado há tempos e tinha esquecido muita coisa.

Uma mão lava a outra

Carlos Drummond de Andrade disse que “entre a raiz e a flor, há o tempo”.

Pensando nisso, prolonguei minha estadia aqui por mais dois meses;  Nina vai me ensinar a cozinhar e eu lhe retribuirei,  ensinando a ler e escrever.

Tenho certeza que nosso verão vai ser de grandes Descobertas!

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A Nora https://blogdosaber.com.br/2023/03/16/https-blogdosaber-com-br-2023-03-16-a-nora/ https://blogdosaber.com.br/2023/03/16/https-blogdosaber-com-br-2023-03-16-a-nora/#respond Thu, 16 Mar 2023 16:34:56 +0000 https://blogdosaber.com.br/?p=1006 Ler mais]]> O destaque de hoje aqui na coluna CRÔNICAS é mais um maravilhoso conto da nossa queridíssima Ana Madalena. Que contribui mais uma vez com a nossa modesta coluna, com uma crônica inigualável chamada “A nora”. Portanto não perca tempo! Assuma a sua condição de espalhado.

A nora

Não sei você, mas na casa dos meus pais,  em dia que chegava visita, era como se fosse domingo.

Minha mãe servia salgados, refrigerante e sobremesa.

Eu adorava ficar escutando as conversas dos adultos e, por óbvio, beliscar uma coisinha aqui outra ali.

Já na pré-adolescencia, eu dei um passo maior;  milagrosamente eu fiquei com a voz igual a da minha mãe e todas as amigas dela, quando telefonavam, geralmente nos confundiam.

E eu, que não era boba nem nada, ficava de papo, escutando o que elas tinham para falar (e sempre era muito assunto) e quando eu cansava, dizia que ia chamar a minha mãe.

As amigas riam:

 -Menina, você enganou direitinho!

Com o tempo, escutando atenta às conversas, peguei até o jeito e as expressões que elas diziam, aprimorando minha “técnica”.

Nunca imaginei que um dia pudesse usar esse conhecimento a meu favor.

Eu acho que fui uma criança que não gostou de ser criança.

Toda a minha infância eu sempre quis ficar rodeada de adultos, de longe um “pessoal” muito mais interessante do que uma porção de pirralhos, que ficavam correndo e jogando queimada!

Meus irmãos eram um grude, brincavam juntos de um tudo, em compensação viviam pegando piolhos.

Sim, porque criança pega piolhos num piscar de olhos!

Eu não chegava nem perto deles; preferia ficar na tranquilidade do meu quarto, lendo romances, de longe um lazer bem mais tranquilo e enriquecedor.

Minha mãe dizia que eu era implicante e do contra, até admito que possa ter sido um pouco disso! Só um pouco.

Eu tinha um sonho: crescer para ficar mocinha.

No colégio, eu olhava para as moças do “ensino médio” e pensava: um dia serei alta e terei peitos iguais aos delas, usarei batom e sandálias com saltos altos!

Algumas até fumavam, e eu achava aquele ritual de aspirar e soltar fumaça uma coisa fantástica.

Nada como o tempo para apagar certas ideias de jerico.

Na hora do recreio eu costumava sentar perto de um grupinho de moças, só para ouvir as conversas, que geralmente eram sobre rapazes.

Eu ainda não tinha despertado esse lado romântico e ficava impressionada quando via algumas delas falando em paixão, quase aos prantos.

Que horror! Tanto drama por causa de um rapaz?

Pior que escutar aquelas baboseiras,  era vê-las, na saída do colégio, aos beijos, em pleno sol do meio dia. Eles suados, os cabelos pregando na testa, as espinhas reluzindo… Eca!

Um dia minha mãe disse que eu me arrumasse, pois tinha sido convidada para ir à casa de uma amiga de trabalho.

Era aniversário do filho dela e haveria um lanche para as crianças.

A menção da palavra “criança” quase me fez desistir de ir ao tal aniversário; eu não tinha paciência para ficar brincando de cobra cega e corrida de saco.

Toda festa era a mesma coisa!

Eu terminava sempre sentada ao lado da minha mãe, só para ouvir aquela troca entre as mulheres, embora a conversa não fosse tão animadora.

Elas reclamavam da trabalheira das crianças, da lida com a casa, da tripla jornada de trabalho.

Eu dizia a mim mesma que só ficaria com a parte boa de crescer…

Nem pensar em casar, ter filhos e ficar arrumando casa. Meu sonho era ser aeromoça, viver arrumada e conhecer o mundo, ir a lugares que só conhecia pelos livros!

– Está na hora do parabéns! Todos para a mesa do bolo.

Um intervalo na narrativa: eu passei anos da minha vida detestando aniversários.

Não sei de onde veio a implicância, até porque na infância meus pais fizeram festas lindas, de encher os olhos.

Acho que eu simplesmente não achava graça em ter que ficar em frente a um bolo, cantando uma musiquinha enjoada, e ainda ter que soprar velas.

Para quê? Revendo as fotos dos meus aniversários, não foi difícil imaginar o porquê  de eu estar sempre olhando para o teto.

Voltando a festinha:

O aniversariante ainda não tinha dado o ar da graça.

Soube depois que ele também não gostava de aniversários, muito menos completando catorze anos, já praticamente um adulto ( pelo menos naquela época, quando aos dezoito já tínhamos responsabilidades.

Hoje a adolescência dura uma eternidade… )

Ele, totalmente sem graça, participou do ritual do parabéns, mas não olhou para cima como eu.

Ficou olhando de um lado para outro, talvez procurando por uma tábua de salvação.

E foi numa dessas passadas de olhos que os nossos se encontraram…

Sim, senhoras e senhores, nossos olhos se encontraram e ficamos meio esquisitos, tentando desviar o olhar, num misto de vergonha e descoberta.

Estávamos nesse magnetismo quando ele soprou a velinha.

Depois, ele sumiu e eu fiquei sentindo uma coisa estranha.

Os dias se passaram e eu fui ficando cada vez mais quieta, diria até que triste.

Não conseguia esquecer o aniversariante, que soube depois chamar-se Pedro.

Meus cadernos eram cheios de corações com nossos nomes dentro:

Pedro e Ana. Estava exatamente desenhando um coração quando o telefone tocou; eu sai correndo para atender, que era uma das minhas obrigações de casa.

Função que eu exercia com muita cautela, desde o dia que minha irmã mais nova atendeu e a pessoa do outro lado da linha perguntou:

– Alô, quem está no aparelho?

Ela, ingênua, entrou no banheiro, causando espanto em quem estava no “trono.

E quando explicou o porquê de estar ali, foi imediatamente proibida de atender qualquer ligação.

E eu assumi a função de telefonista, para mim um feito e tanto.

Adorava dizer: aqui é da residencial dos Albuquerques!

O nosso telefone ficava na parede, no hall de acesso aos quartos.

O fio era enorme e dava para eu andar pela sala, deitar no sofá, ir a cozinha, tomar água, mas quando queria falar algum segredo, eu entrava no lavabo, que ficava exatamente na porta ao lado do telefone.

E foi exatamente o que fiz quando D. Carmem, mãe de Pedro ligou.

Para variar, ela confundiu a voz; ficou conversando comigo pensando ser minha mãe.

E foi quando eu tive a brilhante ideia…

– Carmem, querida ( minha mãe sempre tratava as amigas chamando-as de querida), vou fazer um lanche no fim da tarde do próximo sábado.

Gostaria que você viesse com as crianças.

– É aniversário de algum dos seus filhos?

– Não, é só porque as crianças vão entrar em férias e seria bom ver os amiguinhos.

– Ah, ótimo! Iremos com prazer!

– Que bom, minha querida! Diga a Pedrinho, que mesmo ele sendo mais velho do que meus filhos, que venha também.

Desliguei o telefone com o coração batendo tanto que se soubesse à época o que era infartar, acharia que estava tendo um infarto.

A coisa só piorou quando, do quarto, minha mãe perguntou de quem era a ligação.

Imediatamente disse que era engano, mas foi quando me dei conta que eu estava com um problemão.

Como é que ia ser quando D. Carmem chegasse sábado e minha mãe ficasse sem entender o motivo da visita?

A primeira coisa que eu tinha que pensar era em relação ao que servir.

Minha mãe ficaria chateada em não ter nada especial, nem um refrigerante.

O jeito foi eu quebrar meu porquinho e comprar eu mesma os refrigerantes.

Mas, e para comer? Lembrei que sempre que ficávamos doentes minha mãe fazia o nosso bolo favorito; resolvi ficar doente numa quinta-feira e piorar bastante na sexta.

Como que advinhando meus pensamentos, minha mãe acordou cedo no sábado e bateu um bolo.

Do meu quarto eu ouvi a batedeira.

Minha expectativa ficava maior a medida que o fim da tarde se aproximava.

Por volta das 16.30h meus pais e irmãos começaram a se arrumar para ir à missa; minha mãe disse que eu poderia ficar em casa para não piorar, mas insisti que estava melhor, que queria ir.

Qual a desculpa que daria para botar meu vestido de domingo?

E foi quando estava penteando meus cabelos que as visitas chegaram.

Minha mãe, surpresa, recebeu sua amiga e mesmo sem entender nada, ficou super feliz!

Do meu quarto, escutei a voz de Pedro, quando disse que não queria jogar memória com os irmãos.

Um parêntesis: era comum, quando íamos a casa de amigos dos meus pais, que levássemos jogos de tabuleiro para brincar com os filhos deles, pois algumas das crianças sequer conhecíamos.

Eu nunca participava desse momento, para desespero da minha mãe. E pareceu que Pedro também não.

Apareci na sala com o meu melhor sorriso.

D. Carmem elogiou meu vestido, pegou minha bochecha ( odiava  quem fazia isso, mas naquele momento fiz a “fina”) e disse que eu estava ficando uma mocinha linda.

Meu pai, que estava na varanda com o marido de D. Carmem, olhou para mim e piscando o olho, falou:

– Aninha é uma princesa!

Eu fiz o tipo envergonhada, baixei a cabeça e tentei um certo rubor.

Minha mãe, sabendo que eu não gostava de brincar com as crianças, me puxou num canto e disse:

– Filha, faça companhia a Pedro, sei que voce não tolera os papos dos meninos, mas é o jeito.

Por sorte, seu pai deve ter comprado refrigerantes e tem o bolo que fiz pra você. Já pensou não ter o que servir às visitas?

Eu, quase explodindo de rir por dentro, fiz cara de contrariada e respondi:

-Tá bom, mãe, mas não me peça mais isso. Preferia ir para a missa…

Minha mãe, compadecida, deu um beijo na minha testa e agradeceu.

– Você é uma boa menina!

Chamei Pedro para ir para o jardim. Ele, meio sem graça, pediu licença aos adultos. Ainda pude ouvir quando D. Carmem disse:

– Eles são uma gracinha juntos…

Mentalmente eu agradeci à minha futura sogra. Nessa hora Pedro perguntou se eu gostava de ler e eu, imediatamente respondi:

– Você está perguntando a um macaco se ele gosta de banana!

Para minha sorte ele riu, disse que eu tinha um jeito engraçado e que preferia estar comigo do que brincando com os irmãos.

E foi assim que começou nossa história. Por sorte, D. Carmem nunca mencionou o telefonema, nem minha mãe perguntou sobre os refrigerantes a meu pai. E o bolo salvou a noite!

-Filha, não quero parecer rude, mas você ter ficado doente foi providencial…

E eu, sonsa como nunca, respondi:

– Nem me fale mãe… Alguns males vêm para o bem!

Só para constar, eu e Pedro ficamos grandes amigos; o que nos uniu foi o gosto pela leitura.

Até que tentamos namorar, mas morremos de rir diante dessa possibilidade.

D. Carmem até hoje não se conforma em não me ter como nora! Como na vida nada é definitivo, quem sabe um dia, não é mesmo?

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Eu Estou Foda-se https://blogdosaber.com.br/2023/03/08/eu-estou-foda-se-um-grito-de-guerra/ https://blogdosaber.com.br/2023/03/08/eu-estou-foda-se-um-grito-de-guerra/#respond Wed, 08 Mar 2023 13:00:28 +0000 https://blogdosaber.com.br/?p=904 Ler mais]]> Hoje você vai ler mais uma maravilhosa e irada crônica da nossa incrível Ana Madalena que tem uma imaginação super fértil, com eu estou foda-se um grito de guerra do empoderamento feminino.

Desta vez ela nos presenteia com um conto fenomenal acerca de uma peça do vestuário feminino chamada “Cropped’.

O Cropped

Uma minúscula blusinha que deixa a mostra a metade da barriga e o umbigo.

Sua imaginação vai tão longe que retroage na moda dos anos 40 e volta até os nossos dias citando a inesquecível e incrível Marília Mendonça.

Que consegue criar com um cropped a expressão “Eu sou foda-se”!

Eu estou foda-se

Era uma vez uma mocinha chamada Gabriela, que um dia foi convidada para sair com um rapaz.

Ela ficou eufórica, mas infelizmente sua futura história de amor chegou ao fim antes mesmo de começar. 

Gabriela “levou um bolo” e ficou numa profunda tristeza. Sua irmã resolveu dar uma força e tweetou:

 –  Vai mulher, reage, coloca um cropped!

Em pouco tempo a publicação atingiu altos níveis de compartilhamento e como por encanto, a Internet arranjou uma solução prática e simples para espantar os problemas e desânimo das pessoas.

Colocar um cropped virou um grito de liberdade!


Do it yourself

E também a peça de roupa do momento, embora tenha surgido na década de 30.

Usado principalmente nas roupas de banho.

Já na década de 80, virou tendência, no estilo DIY,  Do it yourself – faça você mesmo, quando “uma galera” passou a tesoura nas suas blusas longas.

A indústria da moda, percebendo esse movimento, caiu em campo; o cropped voltou repaginado, atendendo a todos os corpos, ajudando  mulheres a se desligar das pressões estéticas.


A moda é assunto sério, embora para alguns seja apenas um pedaço de tecido.

Dois psicólogos de uma universidade americana cunharam o termo ” cognição indumentária” para explicar como a roupa que usamos tem interferência sistemática nos processos psicológicos de cada um.

Transmitindo sensações, como auto-estima e poder.

Quem nunca “se sentiu” com uma roupa?


A primeira semana de moda do mundo aconteceu em 1943, chamada de “Press Week”;

Tinha como objetivo apresentar as coleções parisienses para quem não pôde viajar até a capital francesa, depois da Segunda Guerra Mundial.

De lá para cá, muito mudou;

Atualmente a maior revolução da moda  é oferecer aos clientes as roupas que acabaram de “passear” nas passarelas.

No ano passado a griffe Burberry instituiu os desfiles “see-now-buy-now”, “veja agora, compre agora”,

Resultado da popularização das redes sociais e dos tapetes vermelhos, que transmitem ao vivo os desfiles, despertando no consumidor o desejo de adquirir  imediatamente o que foi apresentado.


Um estudo feito sobre o impacto das redes sociais e o consumo  concluiu que o consumidor está cada dia mais imediatista.

Não tem paciência para esperar que os lançamentos demorem meio ano para chegar às lojas.

Esse fenômeno comportamental deve-se ao fato de hoje tudo ser muito rápido e os “looks” serem exibidos à exaustão, tornando o produto praticamente “fora de moda”, seis meses depois, ao chegar nas araras.

No Brasil, as próximas semanas de moda terão apenas desfiles com roupas que possam ser comprados imediamente.

Alguns fabricantes estão pessimistas,  dizem que é um tiro no escuro, que não sabem se o produto vai ser bem aceito, além do risco de um investimento alto.

Realmente não é fácil fabricar algo que agrade multidões, além, óbvio, do fator econômico, que tanto atinge o empresariado, quanto o consumidor.

Com a pandemia e o isolamento, o setor sofreu bastante.


Fast fashion

A industria da moda é a segunda mais poluente do mundo, perdendo apenas para o setor de petróleo.

Essa posição no ranking é creditada ao “fast fashion”, nome dado pela rapidez que as grandes marcas lançam novas coleções, hoje, a cada duas semanas.

O “fast fashion” é um conceito no qual a produção, o consumo e o descarte de uma peça de roupa tem um ciclo muito rápido.

O lixo têxtil, resíduos oriundos das confecções, não tem valor no mercado de reciclagem e terminam no lixão.


O slow food

Contrapondo com a rapidez do “fast fashoin”, já existe o movimento “slow living”, que consiste em um estilo de vida mais tranquilo e cuja filosofia pode ser utilizada em vários setores.

O “modo slow” nasceu na Itália, em 1986, quando um ativista protestou contra a abertura de um restaurante fast food em Roma.

Ele pregava o “slow food”, que consiste numa alimentação sustentável, prestigiando os produtores locais. Vale lembrar que o movimento “slow” não quer dizer moroso, nem muito menos preguiçoso.

Ele oferece a possibilidade de vivermos o presente, pois geralmente projetamos o futuro, ou relembramos o passado, enquanto que a correria nos desliga do presente, que é o único tempo que a vida acontece de verdade.

Na moda, o “slow fashion” é baseado em reduzir as compras para  um número menor de peças, mas com estilo e qualidade de  produtos.

Esse movimento tem por objetivo convidar as pessoas a repensar seus hábitos e estilo de vida.

Pois a correria do dia a dia, além da quantidade de informações a que somos submetidos, resultou no adoecimento das pessoas e, não por acaso, a ansiedade é a doença do século.


O Estou Foda-se de Marília Mendonça

Assisti a um show de Marília Mendonça, onde ela estava vestindo um cropped;. em determinado momento ela disse:


– Eu queria dizer que hoje eu estou inaugurando o uso de um cropped na minha vida.

É por que estou magra? Não, não é.  Eu não estou magra. Eu estou foda-se!


A plateia foi ao delírio e esse vídeo viralizou rapidamente, como tudo que Marília fazia.

Segundo ela, a decisão de usar a famosa blusinha com acabamento acima do umbigo significava a liberdade de poder vestir o que gosta e não se importar com críticas.

E cá pra nós, ela soube, como ninguém, levantar o ânimo da mulherada.

Ela e Gabi, que criou o @menibadocroped e desde então a lista para o uso da frase não pára:


-Está infeliz? Reaja e coloque um cropped!

-Está com problemas financeiros? Reaja e coloque um cropped!

-Está preocupada com o futuro da humanidade? Reaja e coloque um cropped!

-Eu estou foda-se, um grito de guerra, reaja e coloque um cropped!


E eu pergunto: ficou com preguiça de ler essa crônica? Reaja e coloque um cropped! Eu vesti o meu para lhe escrever!

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Autoestima https://blogdosaber.com.br/2023/03/01/autoestima/ https://blogdosaber.com.br/2023/03/01/autoestima/#respond Wed, 01 Mar 2023 11:57:16 +0000 http://blogdosaber.com.br/?p=801 Ler mais]]> O texto a seguir, aqui na coluna CRÕNICAS, desta quarta-feira retrata uma cena urbana do cotidiano de muita gente.

Atualmente, que mora só e divide sua solidão com livros, bichos, plantas e mensagens no celular.

A solidão que faz parte da vida de boa parte dos jovens.

Então, convido você a ler essa inspiradíssima crônica da talentosa Ana Madalena!

Autoestima

Chovia. Ela não se dava conta porque estava concentrada, lendo um  livro.

Usava um fone de ouvido, talvez escutando alguma música relaxante.

Sua mesa, adaptada para home office, era uma bagunça.

Muitas canetas coloridas espalhadas, uma luminária cheia de adesivos, vários livros empilhados e um jarro com uma plantinha seca.

De repente ela desvia o olhar para a janela e percebe as gotas de chuva escorrendo pelo vidro.

Levanta -se, abre a janela e coloca o jarrinho no parapeito. Lembra do gato.

Onde está mesmo o pratinho da ração? Completa com leite.

Segura o celular, como que esperando uma ligação.

Nada. Nem uma mensagem.

Senta novamente diante do livro, dá um longo suspiro, olha para a janela, sorri e resolve virar a página!!!

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À Segunda Vista https://blogdosaber.com.br/2023/02/22/a-segunda-vista/ https://blogdosaber.com.br/2023/02/22/a-segunda-vista/#comments Wed, 22 Feb 2023 09:00:00 +0000 http://blogdosaber.com.br/?p=663 Ler mais]]> Amigos, à segunda vista, sempre são os mesmos.

Não me pergunte o porquê, mas eu realmente adoro o inverno.

Acho que sou dessas pessoas que gosta de folhas secas, dias cinzentos, café em xícaras bordadas e a leitura de poemas de inundar os olhos.

Eu devo ter uma alma barroca na forma, e ancestral nos costumes, daquelas que gostam de poesia, flores na janela, sinos na capela e jantar a luz de velas, para rimar.

Essa sou eu, muito embora algumas pessoas me vejam diferente, como se eu fosse uma pessoa solar, dessas que estampam a alegria do verão.

Ainda bem que mudamos de estação.

Dito isto, quero dizer que não significa que eu seja uma pessoa introspectiva, calada,  muito pelo contrário.

Até queria ser mais comedida, mas gosto de praticar a verve e sei que, quem muito fala, muita bobagem diz. Pensando nisso, resolvi ir a um retiro, para fazer voto de silencio.

Dizem que leva-se 28 dias para modificar um hábito; me inscrevi para a temporada de 35 dias, o máximo por vez. Confesso que não foi fácil, mas consegui!

O que eu não verbalizei, virou rascunho, alguns até sem nexo, como sem nexo deve ser alguma parte de mim.

Revirei várias gavetas internas e tive que ter uma força extra para enfrentar melancolias, quando tive tempo de sobra para refletir.

E uma dessas reflexões veio com uma frase que recebi dentro de um envelope posto por baixo da porta: “Tive grandes preocupações na vida; a maioria das quais nunca aconteceu”. Mark Twain.

Do retiro espiritual para cá, já se passaram muitos anos.

De fato, tive uma mudança significativa de hábitos e hoje me considero uma pessoa mais calma, tranquila. A pandemia só veio reforçar essa quietude, mas, diferentemente do retiro, dessa vez  fiz voto de silêncio por “wa”.

Tive tempo de, finalmente, estar presente na vida das pessoas que eu realmente considero, coisa que, na correria do dia a dia, era mais difícil.

Algumas reforçaram esse sentimento bom, outras foram uma total decepção.

A verdade é que, à segunda vista, nem todos passaram na minha peneira.

Fiquei triste, em princípio, mas depois lembrei da frase de Mark Twain  e resolvi que não faria disso uma questão na minha vida. As pessoas mudam, o que é excelente, mas algumas mudam para um caminho que não é o nosso.

Em compensação, outras são deliciosas surpresas, daquelas que nem o tempo consegue separar. A amizade volta numa leveza tão grande, que mais parece  pássaro que voa sem bater asas.

E foi assim,  num dia cinzento de inverno,  que nos reencontramos.

Em principio não nos reconhecemos. Eu estava numa loja de colchões, totalmente absorta na tarefa de testar o que viria a ser meu cantinho nos próximos anos.

De olhos fechados, com minha cabeça na soleira da cama,  permaneci assim por algum tempo, embalada pela música da loja. Cantarolando alguns versos, escutei alguém dizendo:

– Ana, é você?

Abri os olhos e mesmo de cabeça para baixo, reconheci o sorriso. De um salto, abracei aquele amigo perdido no tempo…

– Por onde andou? Tá morando aqui mesmo? Como vai sua mãezinha?

Sem cerimônia, perguntei a vendedora se tinha um cafezinho e logo pedi dois! E água também. Sabia que a conversa seria longa, até porque não lembrava quando tínhamos nos visto pela última vez.

– Quinze anos? Minha nossa! Que coisa incrível… E moramos todo esse tempo na mesma cidade! Talvez não nos vejamos porque sou muito caseira, principalmente depois que fui mãe.

Imediatamente, mostrei fotos dos meus filhos e comentei um pouco de cada um, suas personalidades e o quanto preenchiam minha vida.

Falei de mim também, do que vi, do que aconteceu, do que me contaram, do que não sei, das minhas dores, dos meus receios, enfim falei “um muito” de tudo.

Pedi mais água e, depois do terceiro copo, comprei o colchão.

A vendedora exibiu um sorriso, como se quisesse dizer ” agora você pode conversar a vontade”.

Sim, eu leio pensamentos.

E não raro eu sei distinguir o estado de espírito de uma pessoa, então, com exceção de nós três  eu, meu amigo e a vendedora, os outros na loja estavam entediados com nossa conversa. Era muita exclamação de felicidade para uma tarde chuvosa.

Solicitei dois travesseiros; entreguei um ao meu amigo e nos deitamos, para testar se eram confortáveis.

E eram. Não por acaso ficamos ali, deitados de perna passada por horas, até que ouvimos a movimentação dos funcionários e a vendedora informou que já estava na hora de fechar a loja. Nossa! 

O tempo voou.

– Ana, daqui a quatro dias é meu aniversário.

Vou fazer uma tarde entre amigos.

Serão pessoas de várias fases da minha vida e quero que você vá. Não se preocupe que chamarei uma amiga em comum, você não se sentirá sozinha, muito embora sei que você não tem problemas em fazer novas amizades. Vou enviar o endereço para seu whatsapp.

No dia do aniversário choveu bastante, mas por sorte a tarde foi apenas nublada.

Ao chegar, pude ouvir uma música suave e conversas animadas vindas do salão de festas.

Eu já sabia que, por algum tempo, ficaria sem a companhia da minha amiga, pois quando estava saindo, liguei para combinar alguma coisa e ela estava tranquilamente fazendo o almoço, imaginando que a festa seria à noite.

Desci a longa escadaria que dava acesso a área onde ficava o salão; me agarrei ao corrimão como a uma tábua de salvação.

Meu pensamento era um só: que eu não caia nessa escada e saia rolando pelo chão…

E quando eu estava nos últimos degraus, passei o olhar pelo rosto dos convidados, todos desconhecidos.

A timidez, encoberta de segurança, deu o ar da graca e por sorte meu amigo veio me receber.

Ele estava eufórico! Saiu fazendo um giro por entre as mesas  apresentando seus amigos do trabalho, da Yoga,  do pilates, de viagens, do grupo de estudo e finalmente do grupo de aleatórios, onde eu fiquei. Intimamente agradeci.

Os aleatórios são, de longe, o melhor papo, pois são pessoas das mais diversas áreas, abertas a novas amizades.

O buffet estava uma delicia;

Engordei quase dois quilos só com os olhos e outros tantos com a boca, principalmente depois do apoteótico parabéns (com direito a vela vulcão, lotus giratória e Sky paper) quando foram servidas várias sobremesas.

Minha amiga, que chegou até mais cedo do que eu  esperava, é intolerante a lactose, glúten, cafeína e outras tantas coisas, e apenas comeu as uvas da tábua de frios, numa inacreditável alegria. Como assim? Quem é feliz sem comer doces?

A tarde passou voando e a noite chegou como um susto!

O céu ficou  totalmente encoberto, anunciando muita chuva. 

Os convidados aos poucos foram saindo, não sem antes registrar esse reencontro em muitas fotos.

Minha amiga disse que me daria uma carona, mas que antes passaria no posto; passou a semana numa correria e não teve tempo de abastecer.

Brinquei dizendo que abastecer carro era uma grande ostentação nos dias de hoje.

Essa crônica agora chega a um fim abrupto, não porque eu não queira mais fazer uso de páginas em branco,  mas porque a escrita não tem cabelos para a gente se agarrar.

Explico: antes de chegarmos ao posto, a gasolina acabou.

Estávamos muito próximo,  pouco mais de 20 metros!

Tivemos, então, a “brilhante” ideia de empurrar o carro.

Minha amiga, magra e intolerante a tudo que comi, era a própria atleta olímpica, já eu…E foi nessa hora que caiu uma tempestade.

O que se seguiu, deixo para sua imaginação, adiantando que nosso amigo largou o restante dos convidados e veio nos socorrer.

A amizade é uma ode a felicidade.

Depois de uma tarde  maravilhosa, de efervescência coletiva, nada como empurrar um carro,  embaixo de chuva,  às gargalhadas, e reconhecer nos amigos, os mesmos que elegemos na infância. 

Obrigada por serem à segunda vista, tudo que vi de primeira!

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Rotina, por Ana Madalena https://blogdosaber.com.br/2023/02/15/rotina-por-ana-madalena/ https://blogdosaber.com.br/2023/02/15/rotina-por-ana-madalena/#respond Wed, 15 Feb 2023 12:10:15 +0000 http://blogdosaber.com.br/?p=587 Ler mais]]> Hoje é quarta-feira! Por isso temos que honrar a criatividade, o talento e a produtividade dos nossos colaboradores. Principalmente, quando esses colaboradores é quem nos proporciona essa maravilhosa audiência.

Portanto vamos ficar agora com a leitura da CRÔNICA Rotina da talentosa Ana Madalena! 

Talvez você tenha um amanhã

Talvez você tenha amigos

Talvez você até tenha tempo para dar e vender

Mas algumas pessoas só têm o hoje, igual a todos os hojes…

Rotina 

Dormia com a janela aberta, mesmo sabendo que o sol entraria muito cedo.

Não era de acordar tarde, mas também não queria saudar o astro rei.

Usava máscara nos olhos para evitar a claridade; tinha fotofobia.

Todos os dias ela acordava “na marra”, quando sentava na beira da cama, fazia suas orações e finalmente se levantava.


Era reservada, mas não perdia oportunidade de saber da vida alheia.

Ao lado da sua casa havia uma obra.

Logo cedo os pedreiros se reuniam para o café, ao mesmo tempo em que ela preparava o seu.

E enquanto aguardava as  torradas ficarem prontas, apurava os ouvidos para saber das fofocas dos trabalhadores.

Há alguns dias acompanhava o romance de um deles com uma mocinha da sua rua.

Estava indignada. Ela era de menor e ele era casado. Qualquer dia contaria tudo! Onde já se viu?


Outro pedreiro, José, um sujeito calmo, cheio de predicados, comprara um carrinho usado para presentear a esposa.

Há alguns meses estava apertado para pagar as prestações.

Não fez as contas do custo de manutenção e a gasolina tinha aumentado bastante.

A esposa não queria mais andar de ônibus; dizia que era coisa de pobre.

Ele, muito apaixonado, arranjara outro emprego, dessa vez como vigia.

Passava os dias cansado e cochilando pelos cantos.

Na única folga, dormia o dia todo enquanto a esposa reclamava que queria passear.

Ele pensou que com a pandemia ela fosse se aquietar, afinal era obesa e tinha pressão alta…


Fátima adorava escutar essas histórias mas tinha que sair para caminhar; dava voltas e mais voltas no quarteirão.

Na pracinha, fazia musculação numa dessas academias ao ar livre.

Não gostava de se exercitar, mas era importante para sua saúde.

Felizmente as pessoas da sua rua eram tão disciplinadas quanto ela.

E entre um exercício e outro, procurava saber da artrite de D. Celeste, o machucado de S. Luís e a saúde da filha de D. Arlete, uma história triste, sem solução.

Sabia que ela precisava desabafar suas dores e a ouvia com atenção.

Vez por outra aconselhava, conselhos ótimos, por sinal.

Ela própria se sentia a melhor psicóloga do mundo quando alguém lhe dizia que suas palavras surtiam efeito. E no íntimo ela pensava porque ela própria não se ouvia…


Voltava pra casa louca por um banho.

Sempre reclamava do calor! Daí até o horário de almoço era em home office, sem chance de levantar para nada.

Odiava aquele emprego mas diante da situação do país, melhor continuar.

Pelo menos tinha um fixo, carteira assinada, férias e décimo.

Ao meio dia fazia seu almoço, mas quando não estava inspirada, comia macarrão instantâneo mesmo.

Às vezes nem isso; apenas um suco para ter tempo de dar um cochilo.


À tarde digitava o relatório das cobranças que tinha feito pela manhã.

Ela negociava as dívidas dos clientes de uma corretora de imóveis.

Algumas vezes fechava ótimos acordos, mas no geral ouvia xingamento de todo tipo.

Estava tão acostumada com a gritaria no “pé do ouvido” que até abstraía; geralmente ficava escolhendo uma nova série, enquanto vez por outra dizia um “compreendo, senhor”.


Às 18.00h se ajoelhava diante da imagem de N. S. de Fátima, de quem sua mãe era devota,  e agradecia por outro dia de trabalho.

Depois se vestia com apuro e ia para a parada de ônibus.

Ali, puxava conversa com alguém disposto a uma prosa e inventava histórias sobre uma vida completamente diferente da sua, talvez sonhando em voz alta.

Se a conversa estivesse boa, pegaria o mesmo ônibus do ouvinte, fingindo fazer o mesmo percurso.

Ou, do contrário, voltaria para o silêncio da sua casa, onde jantaria qualquer coisa.

Depois, assistiria tv e pegaria no sono por volta da meia noite, com a janela aberta, até que o sol entrasse novamente no seu quarto, às cinco e quinze, dezesseis, dezessete…

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Faz de Conta, por Ana Madalena https://blogdosaber.com.br/2023/02/01/faz-de-conta-por-ana-madalena/ https://blogdosaber.com.br/2023/02/01/faz-de-conta-por-ana-madalena/#respond Wed, 01 Feb 2023 16:42:14 +0000 http://blogdosaber.com.br/?p=375 Ler mais]]> Faz de conta…

Dois anos. Hoje uma menininha levanta dois dedinhos para dizer quantos anos está comemorando.

Foi difícil convencê-la da mudança de idade; acostumou-se a responder “um” toda vez que eu fazia a pergunta.

Eu também poderia  fazer essa mesma contagem para mim, uma vez que  nascemos no mesmo dia, sete de julho.

Sim, poderia, mas não vou. São anos demais e ela só sabe contar, ainda, até vinte e três.

Em inglês conta até “ten” e adora dizer as cores “blue” e “green”. Adoro comentar essas coisinhas da minha neta!

Faz de conta…

Maria Cecília nasceu numa madrugada de domingo, antecipando em algumas semanas a sua chegada.

Eu, desde que minha filha ficara grávida e sabendo que nasceria em julho, comecei intimamente a torcer que ela nascesse no mesmo dia da “avó”, mas desisti da ideia; minha torcida iria contra a natureza, e eu não tinha  esse poder. Será?

Era um sábado, quase meia noite da virada do dia seis para o dia sete, quando cheguei à casa dos meus pais.

Eles estavam sob minha “responsabilidade”, uma vez que minha irmã, o anjo da guarda deles, estava viajando e só retornaria na data provável para o nascimento da primeira sobrinha neta.

Eu estava vindo de um jantar oferecido por amigas, disposta a dormir até tarde. No outro dia almoçaríamos todos juntos para comemorarmos.

À meia noite meu celular começou a tocar, eram meus filhos. Leo, que mora em São Paulo, estava reunido com amigos e, numa vídeo chamada, cantou parabéns.

Mariana que chegara há pouco de uma festinha, fez também aquela folia! Aconselhei-a que tentasse descansar; há dias estava sem posição para dormir.

A barriga, enorme, já pesava bastante. Nos despedimos, coloquei meu celular no silencioso, uma máscara nos olhos e dormi profundamente até umas duas da manhã quando acordei sem motivo e, por acaso, olhei o celular, que somava várias chamadas não atendidas de Mariana.

Nessa hora, o telefone residencial tocou; sim, meus pais ainda têm um telefone fixo!

Meu genro ligou informando que já estavam no hospital e que minha neta estava para nascer. Como assim? A bolsa havia estourado! Por sorte, as malas estavam prontas e o hospital ficava a dois minutos de casa.

Meus pais acordaram assustados, temendo algo grave, mas quando souberam da novidade ficaram com aquelas carinhas bobas de “nossa, somos bisavós”!

Deixei o mais novo bisavô em casa ( os homens da família são fracos para hospitais) e segui com minha mãe; às 3:37h minha netinha nasceu, saudável, espertinha e linda, claro!

O hospital estava lotado. Sem acomodações, passamos o dia todo na sala de recuperação, com outras mães e seus bebês.

Naquela madrugada nasceram seis! Alguém  comentou que a data era cabalística, que o dia sete, de todos os números, é o que mais vibra perfeição e quem nasce nesse dia tem grande espiritualidade, além de…Não escutei o restante da explicação; naquela hora, em meio às parturientes, em um ambiente gelado, foi que me dei conta que era meu aniversário e que eu ganhara de presente uma neta!

Maria Cecília, ou simplesmente Maria, como a chamamos, é uma menina maravilhosa.

Como toda canceriana, é bastante emotiva. Adora ouvir música e “ler” seus livros, de longe sua diversão preferida.

É vaidosa, ao ponto de, quando gosta de uma roupa, quer vestir sempre.

Atualmente está encantada com seu vestido de São João! Há dois anos, quando nasceu, estava havendo um surto de sarampo na cidade e ela passou os primeiros meses em casa.

Depois, quando as coisas acalmaram, ela pôde começar a ter uma “vida social”, frequentando escolinhas de natação e musicalização. Infelizmente, pouco depois chegou a pandemia e ela entrou noutro ciclo de isolamento.

Minha netinha ainda estranha o uso de máscara e, muitas vezes, ela puxa a do meu rosto, dizendo:

-Nāo, vovó! Axim não! Tira, tira!

Nossas brincadeiras exigem muitas “caras e bocas” e os olhos não dão conta de expressar tudo.

Estou encantada com a “voternidade”.  É uma delícia voltar a entrar no mundo do faz de conta!

Fonte: Ana Madalena

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Madrinha, por Ana Madalena https://blogdosaber.com.br/2023/01/25/madrinha-por-ana-madalena/ https://blogdosaber.com.br/2023/01/25/madrinha-por-ana-madalena/#respond Wed, 25 Jan 2023 19:53:33 +0000 http://blogdosaber.com.br/?p=276 Ler mais]]> A nossa colaboradora e cronista Ana Madalena está fazendo muito sucesso, aqui na coluna CRÔNICAS com suas histórias originais e pitorescas, de leitura fácil e gostosa. Mas tenho a impressão que a crônica desta quarta-feira será imbatível, pois “A Madrinha” é uma história que prende o leitor até o fim, uma história criativa e fascinante. Então, lhe convido a fazer esta gostosa leitura.

Tem sempre alguém no mundo tendo o melhor dia de sua vida. Essa frase pipocou na cabeça de Larissa; queria saber se todos teriam esse dia ou se essa alegria era reservada apenas para alguns. Dizia que não fazia sentido viver toda uma vida esperando por essa possibilidade. Pense numa pessoa complicada! A minha vontade era dizer algumas verdades, mas não gosto de passar na cara. É cruel.

Tudo começou há alguns anos. Estávamos no primeiro ano da faculdade e fomos fazer uma pesquisa, num bairro afastado. Sem muito senso de direção, nos perdemos e demos muitas voltas até que o motor do carro começou a fumaçar. Nossa reação imediata foi desligá-lo e sair correndo, imaginando que fosse explodir. Depois de uns minutos percebemos que a fumaça diminuía e finalmente paramos para olhar onde estávamos. A rua, enlameada, tinha poucas casas e as pessoas à porta não pareciam cordiais. Senti que éramos intrusas, mas por sorte vimos uma borracharia e seguimos em busca de ajuda.

O proprietário nos olhou com desprezo; com um palito no canto da boca, apontou a placa e depois os pneus ao redor. Ali não era oficina, respondeu grosseiramente. Nessa hora apareceu um rapaz muito bonito e disse que poderia nos ajudar. Percebi uma troca de olhares entre ele e o borracheiro, mas também entre ele e Lari.

O problema do carro tinha sido a falta de alguma coisa, que esquentara o motor. Aguardamos um pouco enquanto esfriava e pedimos orientação para sairmos dali, local que abrigava uma boca de fumo, como soubemos depois. Ele se ofereceu para deixar-nos no posto de gasolina da “principal”, e enquanto eu dizia que não precisava, Lari toda “derretida” agradecia pela ajuda. Ele sentou no banco do carona, o meu lugar, e eu intrigada, pensei: quem é esse sujeito folgado na fila do pão?

Era Firestônio! Cai na risada pensando ser um chiste. Não era. O pai, o borracheiro, achava esse nome bonito e forte! Que excêntrico, comentei. Para os íntimos era Tônio e pelo que entendi, Lari já era dessa turma. Finalmente chegamos ao posto, quando

vi que trocaram o número de celular.

O namoro deles foi instantâneo. Naquela mesma noite ele foi à casa de Larissa. Estava na cara que ele era um sedutor oportunista e a minha amiga, que sofria de carência crônica, caiu feito um patinho. A resistência da família em relação ao namoro foi enorme, mas ela bateu o pé e os pais resolveram não implicar. Assim como eu, aguardariam  o dia que caísse a ficha, coisa que aconteceu uns quatro meses depois, com a notícia da gravidez.

Larissa é dessas pessoas inconstantes; precisa de novidades e adora ir contra a maré. Durante seu namoro com o “nome de pneu” nos afastamos. Ele, assim que soube que ia ser pai, foi logo exigindo casa, comida e roupa lavada, além de uma mesada. A coisa toda foi tão absurda que até Larissa percebeu a situação e terminou o namoro. Aí foi outra confusão, com ele ameaçando tomar o filho e mais uma série de coisas. Muito antes do bebê nascer foi preso por venda de drogas.

Pedrinho nasceu numa quarta feira de cinzas, com pouco mais de sete meses. O parto, prematuro, foi uma loucura. Estávamos caminhando na orla da praia quando a bolsa estourou. Nossa sorte foi ter uma ambulância por perto que nos levou para a maternidade mais próxima. Lari chorou todo o percurso num misto de medo e sabendo que a partir daquele momento sua vida mudaria por completo. Desde esse dia, nunca mais colocou seu “bloco na rua”. E como é amarga, ficou feliz por esse ano não ter carnaval. Ainda bem que essa não é uma história triste, pelo menos para Pedrinho, que é uma criança pra cima, feliz e tem um amor de madrinha, que faz jus ao “cargo”.  Eu, claro!

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Carolina https://blogdosaber.com.br/2022/11/30/carolina/ https://blogdosaber.com.br/2022/11/30/carolina/#respond Wed, 30 Nov 2022 21:07:52 +0000 http://blogdosaber.com.br/?p=98 Ler mais]]> A nossa coluna crônicas desta quarta-feira trás mais uma incrível história da nossa ex-colaboradora e competentíssima escritora na Madalena, ainda inédita aqui no blog do saber. Trata-se de um triângulo amoroso extraordinariamente bem pensado pela autora difícil de qualquer afegão médio imaginar. Por isso convido você a ler essa crônica maravilhosa e se divertir a valer!

Segundo uma lenda japonesa, as pessoas são unidas por um fio vermelho, um fio que nos liga a pessoa que estamos predestinadas, não apenas de forma romântica. Eu não acredito em destino; se assim fosse, nós seríamos passivos e inertes esperando pelo futuro. Nunca me imaginei carregando um fio, procurando a quem me amarrar…


– Eu posso ter dez minutinhos de sua atenção? Sei que o que tenho a dizer não interessa a nenhum de vocês, mas é por isso mesmo que quero sua ajuda. Eu me chamo Júlia, sou uma mulher independente, solteira e com muitas dúvidas. Sou filha única e, talvez por isso, tenha me acostumado com o silêncio da casa dos meus pais. Aos 25 anos resolvi morar  sozinha, ter meu cantinho e detesto que invadam minha privacidade. Já tive alguns relacionamentos, mas não prosperaram. Confesso que sou muito exigente, não dou atenção a qualquer um. O que espero de um homem é que ele tenha, pelo menos,  uma boa interlocução, algo raro nos ambientes que frequento, cheios de pessoas da geração “mimadium”, que, incapazes de passar por alguma rejeição, já ficam cheios de mimimi.  Mas, apesar de todo esse meu discurso, há dois anos eu quebrei a cara!


Conheci André e me encantei!  Ele parecia ser um homem maduro, muito familia, além de extremamente romântico. Nós nos dávamos super bem, ele sempre me elogiou muito, o tipo de homem que valoriza a mulher. Ele, apesar de ter seu apartamento, sempre preferia passar o fim de semana comigo, quando fazíamos programas bem caseiros.  Tudo estava indo bem até que há um ano ele foi dispensado do emprego, onde trabalhava com informática.


Ele me propôs morarmos juntos e eu, apesar de não achar o momento para isso, afinal ele estava desempregado, me iludi achando que ele estava fazendo planos para casarmos e aceitei na hora. Dormi com sonhos de Cinderela e acordei com pesadelos: muito cedo ele chegou com malas e cuias! Fiquei sem graça, mas ele veio com aquele papo de que poderíamos começar nossa vida ali no meu apartamento e depois partiríamos para um lugar maior. Tambem falou que seu contrato de aluguel estava expirando e, morando juntos, dividiríamos as despesas. Achei uma proposta razoável.


Mas, dois meses se passaram e ele não se movimentou para arranjar um emprego. Passamos a discutir por tudo, até porque ele não estava colaborando com despesa alguma. Como uma pessoa que acabou de receber a rescisão e estava no seguro desemprego, não tinha dinheiro nem para o cigarro? Resolvi ter uma conversa e ele, todo chateado e melindroso, disse o óbvio, que colaboraria mas, à partir daquele dia, coisas banais passaram a se tornar maiúsculas. Nessas alturas do campeonato, eu já estava cavando uma boa briga para ele ir embora.


Ele, percebendo algo no ar; disse que estava montando a própria empresa, que não estava inerte, como estava sendo “acusado”. Sugeriu colocar o escritório no segundo quarto do apartamento, onde era uma espécie de   closet. Mais uma vez fiquei sem graça em dizer não, mas diante da possibilidade dele conseguir clientes e resgatar sua auto estima, aceitei a proposta. Dois dias depois ele trouxe uma moça para ser sua secretária, alegando que ela trabalhara com ele e que era uma excelente pessoa e muito eficiente.  Falou também que ela tinha os dados dos clientes da empresa que fora dispensado e que iria propô-los o mesmo serviço, por um preço bem inferior. Tinha certeza que todos aceitariam. Ele faria as visitas aos clientes, abriria mercado e Carolina faria a parte burocrática. Apesar de eu ter várias ressalvas, reconheci, com o passar dos dias, que Carolina era um amor de pessoa,  além de extremamente organizada.


A empresa em pouco tempo começou a dar lucros; André, conseguiu captar uns 80% dos antigos clientes, além de ter aberto uma lista de novos contratos. Ele realmente era muito bom no que fazia. Carolina tambem se revelou uma profissional dedicada, além de ir além de sua funções; a gente quase não se encontrava: a hora que eu saía, ela estava chegando e vice versa. Ela se deixava presente em detalhes, como na louça que ficava na pia e ela sempre lavava ou quando eu chegava à noite e a mesa do jantar estava posta, às vezes com alguns mimos, tipo pães que ela comprava ou biscoitinhos.


Tudo parecia caminhar bem, até que um dia, precisei voltar mais cedo para casa e peguei meu namorado jogando videogame em pleno expediente. Carolina confidenciou  que ele jogava o dia todo e ela que fazia todo o trabalho, mal tirava meia hora para almoçar. Também disse-me que esse foi o motivo dele ter sido dispensado; várias vezes foi pego jogando. Fiquei indignada, mas aguardei um momento propicio para tocar no assunto.


Uma manhã ele veio com um papo que Carlolina tinha sido expulsa da casa dos pais porque estava grávida e que não tinha para onde ir. O namorado dela tinha sumido e ele, solidário ao problema, convidou para ela passar uns dias conosco, até arranjar um lugar para ficar. Na hora me senti duplamente chateada, afinal a casa era minha e eu tinha que ser consultada. Também não me agradava ter minha intimidade dividida com outra pessoa; como já disse, sou filha única e me acostumei a viver só. Mas, minha natureza de canceriana, com ascendente em todos os signos, fez eu aceitá-la como hóspede temporária.


O convívio com Carolina foi, para meu espanto, muito bom. Ela é uma pessoa leve, bem-humorada, que nunca pesa no ambiente. Por termos muito em comum, viramos amigas, tão amigas ao ponto de André ficar incomodado e terminar o nosso namoro. Confesso que estranhei, mas não achei ruim, foi até um alívio. Mas, com isso, ele também tirou a “empresa” e Carolina foi demitida. Achei isso de um mau-caratismo, afinal ela estava grávida… De certa forma, me senti responsável por ela.


Carolina agora está com oito meses de gravidez e decidiu saber o sexo do bebê: uma menina! Disse-me que vai se chamar Júlia, em minha homenagem. Fiquei emocionada! Mas, (sempre tem um mas…) Carolina resolveu ir embora; vai morar no sítio de uma tia, num vilarejo muito pobre. Confessou- me, para meu desespero,  que essa criança é filha de André e que ela não aguentava mais mentir para mim. Ela disse que quando ele soube da gravidez pediu que abortasse, que não queria filhos. Eu, depois de todo o relato, me senti novamente traída.


Confesso que não me agrada saber que Carolina, uma moça tão inteligente, terá que viver em um sítio, sem a menor possibilidade de um crescimento profissional, além de Julinha crescer num ambiente limitado. Por outro lado, meu coração já está tão apegado a Carolina e a essa menininha, que até pensei em considerar delas morarem comigo. Meu receio é que, caso ela aceite o convite, quando a criança nascer, André resolva assumí-la e tirar-me desse convívio. Fico triste só em imaginar…O que faço?  Será que esse é o tal fio vermelho do meu destino? Aguardo respostas!

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