Arquivos abuso - Blog do Saber https://blogdosaber.com.br/tag/abuso/ Cultura e Conhecimento Mon, 29 Apr 2024 13:13:21 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=6.4.3 Baby Reindeer: a vida como ela é https://blogdosaber.com.br/2024/04/30/baby-reindeer-a-vida-como-ela-e/ https://blogdosaber.com.br/2024/04/30/baby-reindeer-a-vida-como-ela-e/#respond Tue, 30 Apr 2024 09:30:00 +0000 https://blogdosaber.com.br/?p=4851 Ler mais]]> A minissérie

A minissérie da Netflix, ‘Baby Reindeer’ (no português, ‘Bebê Rena’), alcançou o primeiro lugar no streaming após uma semana do seu lançamento. O que era para ser uma simples história de perseguição com tom de comédia logo se transforma em um thriller complexo e angustiante. Cuidado, aqui, contém muitos spoilers!

‘Baby Reindeer’ conta a história do próprio Richard Gadd, protagonista e criador da série, começando e terminando pela perseguição de uma mulher obcecada por ele. Gadd expõe a sua vida, família e intimidades que normalmente lutamos para encarcerar. E, talvez, essa seja a maior surpresa: a exposição de traumas e conflitos internos de um homem. Tudo para justificar o tempo que ele levou para denunciar a sua perseguidora, sob o codinome Martha.

Seis meses que só foram interrompidos pela denúncia porque os problemas provenientes da perseguição alcançaram e colocavam em risco outras pessoas do seu círculo social. Gadd se pegou em uma relação de dependência com Martha, que o admirava e o incentivava a seguir com a sua carreira tão desejada de comediante. Finalmente, Gadd era reconhecido por alguém, o que o remete, mais tarde, a um homem de seu passado, sob o codinome Darrien, que também teria visto algo de especial nele.

A revelação

Martha e Darrien não apenas adoravam Gadd, eles queriam algo em troca: a sua atenção, o seu corpo, o seu sexo. Ambos sedutores, com as suas armas, ambos abusadores. Gadd, abusado por um homem e por uma mulher, tendo a sua sexualidade violada, remexida, virada do avesso, questiona-se quanto às suas preferências sexuais, procurando, inclusive, uma resposta no envolvimento com uma mulher trans.

O mais interessante de toda essa história é que Gadd é só mais um no meio de tantos homens e mulheres que são abusados e se deixam abusar, com questões que não conseguem sanar. ‘Baby Reindeer’ expõe a crueza da vida e incita em nós uma tentativa de revelação: das nossas fragilidades, tendências, desejos mais íntimos. Masoquistas, sádicos, obsessivos, perversos, narcisistas. São diversos os traços de caráter que nos circundam e ameaçam a nossa integridade. Integridade no sentido de inteiro, de manter-se no eixo.

A série não tem um final feliz. Nem triste. O final segue fiel à retratação da vida real, a vida como ela é: cheia de desafios, alegrias e frustrações. A vida como ela é: de dúvidas e eternas insatisfações.

]]>
https://blogdosaber.com.br/2024/04/30/baby-reindeer-a-vida-como-ela-e/feed/ 0
A fragilidade dos sexos na era do empoderamento feminino e das “machosferas” https://blogdosaber.com.br/2023/06/20/a-fragilidade-dos-sexos-na-era-do-empoderamento-feminino-e-das-machosferas/ https://blogdosaber.com.br/2023/06/20/a-fragilidade-dos-sexos-na-era-do-empoderamento-feminino-e-das-machosferas/#respond Tue, 20 Jun 2023 09:30:00 +0000 https://blogdosaber.com.br/?p=1745 Ler mais]]> A gigante acordou

O empoderamento da mulher nas sociedades atuais tem mudado conceitos e evidenciado extremismos. Apesar dos números referentes ao feminicídio e à violência doméstica voltada para a mulher terem aumentado nos últimos anos, a valorização das conquistas do feminino segue no mesmo ritmo. Isso seria uma resposta das mulheres aos casos policiais ou os casos policiais seriam uma resposta dos homens a esse empoderamento? Ou, ainda, teriam os casos policiais apenas mudado de nomenclatura, de homicídio para feminicídio?

Enquanto as mulheres têm descoberto e exercido um poder que elas não faziam ideia que tinham dentro das sociedades patriarcais, os homens simplesmente não sabem o que fazer em relação a isso. Dentro de uma sociedade fálica, aos sexos são atribuídas tarefas, papéis e trejeitos diferentes. Quando o poder é dado ao sexo que não o possuía, existe algo de excitante. Já quando ele é retirado daquele que o possuía, existe algo de frustrante.

Sexos frágeis

As mulheres excitadas querem cada vez mais o que elas descobriram e os homens frustrados, em contrapartida, estão apavorados. Alguns, mais passivos, vão tentar entender o que se passa e, quem sabe, adaptar-se a essa nova mulher. Já outros, mais ativos e dominadores, vão entrar na negação do fato.

Mas, de fato, não é fácil ser homem ou mulher. Talvez, nunca tenha sido. Todos nós, antes de mais nada, somos seres humanos. Seres reprimidos, traumatizados, que têm dúvidas, que se contradizem. Nós somos vulneráveis, sejam os passivos sejam os ativos. O empoderamento da mulher possui pelo menos dois pontos de fragilidade:

  1. Por enquanto, em termos gerais, a mulher tem sido poderosa apenas para ela mesma. Enquanto os homens não entenderem ou se adequarem ao novo papel da mulher na sociedade contemporânea, esse papel continuará sendo negligenciado nas esferas políticas, sociais, profissionais e pessoais;
  2. Nesse novo papel, a mulher também se acha perdida, assim como os homens. É difícil definir até que ponto elas podem ou devem ir. É aquela história de quando o poder sobe à cabeça. “Posso me vestir como eu quiser!”. Mas será que é bem assim?
Direitos e deveres

Configura o crime de ato obsceno, a “manifestação de cunho sexual praticada em local público ou aberto ao público, capaz de ofender o pudor médio da sociedade”. Pudor médio da sociedade. O que isso quer dizer? Muitas coisas! A variar com a perspectiva de cada um. Mas pensando no “mediano” e que a sociedade brasileira é constituída em maior parte por pessoas educadas a partir de uma fé religiosa de natureza cristã, poderíamos dizer que o ato de andar pelas ruas despido, semidespido ou evidenciando genitálias ou zonas erógenas configuraria crime? É provável, não? Mas, na contramão disso, as mulheres vão se vestindo de forma cada vez mais erotizada. E, pasmem, elas não são penalizadas por isso.

Mas os deveres não deveriam ser iguais também? Pois é. É nesse ponto, por exemplo, que a coisa é desvirtuada. Ou melhor dizendo, distorcida. Passar a ter poder significa ter mais poder que o outro? Não deveria, certo? Não, se o discurso é “direitos iguais”. Poderíamos estar falando de abuso de poder, então?

Parece que os excessos levam ao nada

É provável que o “abuso” por parte das mulheres seja o principal fator que contribui para a formação de “machosferas” como a Red Pill, grupos de homens com pensamento conservador, que denigrem a mulher em seu novo papel, e com maioria decidida a não ter mais relacionamentos duradouros com elas. Ou seja, é a contraofensiva. Afinal, grupos reativos só surgem a partir de movimentos radicais. Da mesma forma, a alta no número de feminicídios pode também estar ligada a essa contraofensiva.

Ou não. Talvez, esse número apenas esteja aos poucos se tornando oficial. Antes do poder, as mulheres simplesmente aceitavam o que estava determinado pela sociedade para elas. Raras se separavam ou pediam o divórcio. Mas, com a criação de leis voltadas para mulheres e as redes sociais para propagar os absurdos sofridos por elas, perceberam que unidas eram mais fortes. Com os depoimentos vindo à público, outras mulheres vão se sentindo mais à vontade ou seguras para também contarem as suas próprias histórias e para se imporem.

Por um ou por outro, o fato é que todos estamos tendo que lidar com mudanças extremamente significativas: o abuso de poder das mulheres, a contraofensiva masculina, a desconstrução do masculino e do feminino e ainda o abuso de poder dos homens, nas mais diversas esferas da sociedade. É um momento confuso e cada um busca reencontrar o seu próprio papel. É como se estivéssemos, nesse momento, desrotulados e, por mais que ainda haja quem tente dar rótulos, eles simplesmente não cabem em nós. Não mais. Somos como peixes fora da água, mas à margem dela. Temos tudo e não temos nada. Somos tudo e não somos nada.

]]>
https://blogdosaber.com.br/2023/06/20/a-fragilidade-dos-sexos-na-era-do-empoderamento-feminino-e-das-machosferas/feed/ 0
Projeto Eu Me Protejo: a luta contra a violência sexual infantil https://blogdosaber.com.br/2023/05/02/projeto-eu-me-protejo-a-luta-contra-a-violencia-sexual-infantil/ https://blogdosaber.com.br/2023/05/02/projeto-eu-me-protejo-a-luta-contra-a-violencia-sexual-infantil/#respond Tue, 02 May 2023 09:30:00 +0000 https://blogdosaber.com.br/?p=1408 Ler mais]]> Nascida em 2020 no Distrito Federal, a revistinha Eu Me Protejo, de autoria da jornalista Patrícia Almeida e da psicóloga Neusa Maria da Costa Ribeiro, é uma cartilha que ensina as crianças a se protegerem da violência sexual. Ainda em 2020, recebeu o Prêmio Neide Castanha de Direitos Humanos de Crianças e Adolescentes. Em 2021, o projeto voluntário ganhou o clipe Meu corpinho é meu, mais um recurso para ser transmitido nas escolas.

No site Eu Me Protejo, há vídeos, jogos, poemas, músicas, teatro de fantoches etc que reforçam os ensinamentos da cartilha. A ideia do projeto é que o conteúdo seja disseminado ao maior número de crianças possível. Afinal, segundo dados, 68% dos registros no sistema de saúde, referem-se a estupro de menores. O site ainda revela que não temos um número maior de denúncias porque, dentre outros motivos:

“O abuso vem de quem cuida, ou de uma pessoa próxima”;

“A vítima não sabe reconhecer os tipos de toque, ou o que é o ato sexual por falta de acesso à escola e à informação adaptada.”

“Desconforto da família em ‘conversar sobre o assunto’ – tabu.”

“Medo da exposição e do processo legal.”

Em dezembro de 2022, Eu me Protejo ganhou o prêmio Pátria Voluntária. Para saber mais sobre o projeto, acesse Eu Me Protejo.

O corpo da criança

Na Psicanálise, tratamos o corpo da criança como algo admirável ou, dizendo de uma forma mais absurda, sedutora. Mas é fato que a sua pele é mais macia, possui odor mais agradável e, por mais que não haja grandes curvaturas, tudo é mais bonito, mais rosado, mais rechonchudo, mais firme, menos peludo, mais higiênico, inclusive. Não é à toa que, quando vemos um bebê, a reação comum é fazermos caras de bobos, não conseguirmos parar de olhar, querermos apertar ou morder, certo?

Assim, começa o jogo entre os corpos das crianças e dos adultos, sem que sequer percebamos. As trocas de carícias, as repreensões, os incentivos à vergonha bem como à sexualização. E o sujeito enquanto criança não tem filtros, não tem discernimento, não tem capacidade crítica. Se o seu responsável, sem jeito ou com repugnância, não a ensina, o jovem estará sempre a mercê de uma outra figura adulta, que pode simbolicamente substituir o seu pai ou a sua mãe, “ensinando-a” de uma outra forma.

O abusador

Como falei no texto Poder e submissão: até que ponto o estado é efetivo contra a violência doméstica?, esse indivíduo vai sempre procurar alguém mais vulnerável que ele para fazer de vítima. O abusador é provavelmente alguém que já foi abusado, reprimido ferozmente ou que está fixado num modelo narcísico e, principalmente, onde não houve recalque. Em outras palavras, estamos falando de um sujeito que desenvolveu um outro tipo de estrutura psíquica para que pudesse sobreviver.

Para o abusador, a lei não intimida. O seu desejo está acima de todas as coisas e todos os outros são meros objetos. Ele impõe no outro o que o outro não quer. E se o outro não sabe o que quer, fica ainda mais fácil de impor o seu desejo, não? É aí que entra a importância do posicionamento das crianças.

‘Quem não sabe onde quer ir, qualquer caminho serve’
Criança exprimindo rejeição

A frase é de Lewis Carroll e serve para qualquer um, seja criança ou adulto. Mas, afinal, uma criança pode definir o que quer?

Por mais que a criança seja uma página em branco, onde nós adultos que a cercam tendemos a carimbar com as nossas crenças, ela tem o direito de escolha, de livre expressão, de dizer se se sente mais ou menos confortável com isso ou aquilo. A criança sempre vai tender a se sentir como os seus responsáveis se sentem ou se expressar também como eles se expressam. Afinal, os adultos funcionam como um espelho. Por isso, a necessidade do cuidado quando ensinamos e da comunicação clara, reduzida de ambiguidades.

Ela precisa entender o que é dela e o que é do outro, o que é confortável e o que não é, o que é necessidade dela e o que é necessidade do outro, que dizer sim e não são ambas opções, que nem todos os adultos vão protege-la e que ela deve procurar ajuda de alguém com quem se sente confortável toda vez que sentir desconforto.

]]>
https://blogdosaber.com.br/2023/05/02/projeto-eu-me-protejo-a-luta-contra-a-violencia-sexual-infantil/feed/ 0
Guerra ao amor: por que insistimos no erro? https://blogdosaber.com.br/2023/03/21/guerra-ao-amor-por-que-insistimos-no-erro-do-lado-obscuro-do-amor/ https://blogdosaber.com.br/2023/03/21/guerra-ao-amor-por-que-insistimos-no-erro-do-lado-obscuro-do-amor/#respond Tue, 21 Mar 2023 09:30:00 +0000 https://blogdosaber.com.br/?p=1057 Ler mais]]> Baita amor romântico!

Na psicanálise, costumamos dizer que você se apaixona basicamente por dois motivos: ou você encontrou alguém que admira e gostaria de ter sido ou é alguém com quem você se identifica de alguma forma. “Ah, nós somos iguaizinhos: pensamos da mesma forma, gostamos das mesmas coisas”.

“E, afinal, o que ela tem que me faz querer ficar nesse relacionamento?”. A resposta é sempre a mesma: algo de familiar. Ela te lembra alguém que você muito admirou. Talvez, até você mesmo. E esse é o motivo pelo qual naturalmente insistimos em algumas relações que, muitas vezes, são infrutíferas, cansativas e, até mesmo, abusivas. Esse é o lado obscuro do amor!

Mas abusivas pra quem?

À exceção dos casos em que o indivíduo é ameaçado de morte, todos continuamos em relacionamentos abusivos porque temos um ganho em algum ponto. Ou o seu parceiro é seu ídolo (seja pelo que você gostaria de ser seja pela similaridade entre vocês), ou você não consegue ficar sozinho ou depende dela financeiramente. Ah, e, claro, tem também o “achar que depende”.

O fato é que quando nos comprometemos com algo, não queremos falhar. Afinal, não se trata somente de você e da outra pessoa com quem está, trata-se também de toda a comunidade, todas as pessoas que te cercam. Vão questionar e, por mais que o problema seja realmente única e exclusivamente do casal, você vai querer se explicar. Que trabalheira, não?

Assim, ficamos à procura de argumentos: “mas ela é linda”, “mas ele cozinha tão bem”, “mas o sexo é o melhor que já tive”, “mas ele dá tanta atenção à minha família”, “mas ela é tão carismática, todos os meus amigos a acham incrível”, “mas ele até me ajuda com as atividades domésticas!”. E seguimos empurrando o relacionamento com a barriga, sem perceber o lado obscuro do amor.

The check, please!

No final das contas, basicamente, permanecemos num relacionamento, digamos, caótico ou entediante, por dois motivos: ou porque não nos suportamos e precisamos de alguém para nos dizer, pelo amor de Deus, o contrário, que “sim, eu sou suportável” ou porque eu me admiro tanto que preciso estar cercada de pessoas como eu. Ou seja, sempre há um ganho. Mesmo que o saldo não seja positivo. Sim, pois amamos e odiamos. E, nesses casos, o ódio é sempre maior que o amor.

Cego em tiroteio

No entanto, quando estamos no relacionamento, não conseguimos enxergar os problemas claramente. É como uma pessoa que sofre de astigmatismo sem os seus óculos: ela vê que há algo ali, vê formato, cor, tamanho, mas está tudo embaçado e fica impossível dizer exatamente do que se trata. Estamos envolvidos, há forças internas e pessoas querendo nos influenciar a seguir no sentido contrário, cada vez que forçamos a vista e tentamos enxergar melhor.

Por isso sofremos tanto ao final de um relacionamento, mesmo sendo aquele abusivo. Mesmo sendo aquele babaca ou aquela pilantra. E por isso, nas fases do luto, passamos pela fúria e, em seguida, pela euforia, logo após a desvinculação com o ‘ex-objeto amoroso’. Saímos do envolvimento e, finalmente, conseguimos ver.

E, afinal, é erro ou não é?

Bom, para a Psicanálise, não existe certo ou errado. Existe, sim, o “até que ponto você banca isso?”. Se, para compreender uma situação, é preciso passar por ela, como podemos chamar de erro a trajetória do conhecimento? Um amor só acaba quando se torna insustentável para pelo menos um dos integrantes. E, para que se torne insuportável, é preciso primeiro fazê-lo valer.

Insistir no erro do amor é tão natural quanto nascer pelado. Mas o tempo que leva para nos darmos conta do “até que ponto eu banco isso?” vai depender do nível de entendimento de cada indivíduo sobre o seu próprio desejo.

]]>
https://blogdosaber.com.br/2023/03/21/guerra-ao-amor-por-que-insistimos-no-erro-do-lado-obscuro-do-amor/feed/ 0